Mostrando postagens com marcador filosofia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador filosofia. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 28 de junho de 2024

Eneias, o Modelo Romano do Homem Ocidental


A Eneida de Virgílio, mais do que a Ilíada ou a Odisséia de Homero, encarna o ethos do homem ocidental. Apesar da inegável influência helênica sobre os romanos, essa influência foi mais intelectual e estética do que moral. No âmbito moral, o romano é a antítese do homem grego, já decadente na época da conquista romana. No entanto, mesmo antes, em confronto com os grandes pensadores gregos da antiguidade, entre os quais o próprio Homero, o romano demonstrava total aversão à moral helênica. O filósofo grego pré-socrático, Xenófanes, crítico da moralidade da época, diz: "Homero e Hesíodo atribuíram aos seus deuses todas as coisas que são uma desgraça para os mortais: roubo, adultério, enganar uns aos outros." Enquanto Odisseu, na obra de Homero, é ardiloso, vingativo e sem nenhum escrúpulo moral, Enéias, personagem central da Eneida de Virgílio, encarna o romano ideal, detentor de três das mais estimadas virtudes romanas: 

virtus: conjunto  de  qualidades morais, como a bravura, a retidão e a coragem, forjada no crisol da honra; 

fides: a fidelidade, o respeito e a lealdade que tecem os laços entre homens e as instituições; e  a 

pietas: a mais nobre das três, que abraça regras de comportamento, reverência e obediência. É a devoção à gens (linhagem), à Pátria e aos laços naturais com pais, filhos e parentes.

primeiros versos da Eneida em vernáculo nacional, português, por três diferentes autores em diferentes épocas. Poucas línguas no mundo 
permitem traduções tão fidedignas e líricas como o original, e claro, concomitante ao talento dos autores.

A pietas, dentre as três, é mais estimada, por sintetizar as demais. Os membros da comunidade familiar, unidos sob a proteção da patria potestas e projetada pelo culto aos antepassados. Daí provém o sentido cristão de piedade, como prática de veneração ao divino e compaixão para com a divindade. 

Júpiter todo ­poderoso, se tu não odeias ainda os troianos até o último, se a tua antiga piedade lança ainda um olhar sobre as misérias humanas, concede à nossa frota escapar agora às chamas, ó pai, e salva da destruição o pobre recurso dos Teucros! (Eneida V)

Enéias revela-se como o portador da pietas, a qualidade essencial que o distingue. Manifesta em seu respeito e obediência aos deuses, permeando todas as suas decisões. Tamanha é sua obediência que, mesmo apaixonado pela rainha Dido, a abandona para cumprir sua sina, guiado pelo fatum, a crença no destino, a que até os próprios deuses estão submetidos, e que impunha, aos romanos, as agruras, vicissitudes, guerras e ódios a suportar, para, assim, alcançar seu glorioso destino revelado naquele momento pelo próprio Deus Júpiter.

Enquanto Enéias foge de Tróia (Livro 2), Virgílio o descreve carregando seu pai idoso (Anquises) nas costas enquanto conduz seu filho (Ascânio) pela mão. E dá instruções à sua família sobre como escapar de Tróia:

Venha então, querido pai, segure meu pescoço: vou

Carrega-lo em meus ombros: essa tarefa não me é um peso.

Aconteça o que acontecer, será para nós dois, o mesmo risco compartilhado,

e a mesma salvação. Deixe o pequeno Lulus vir comigo,

e deixa minha esposa seguir nossos passos à distância.

Vocês, servos, prestem atenção ao que estou dizendo.

Na entrada da cidade há um monte, um antigo templo

de Ceres abandonado, e um venerável cipreste próximo,

protegido ao longo dos anos pela reverência de nossos ancestrais:

vamos para aquele lugar por diversos caminhos.

Você, pai, pegue os objetos sagrados e os Deuses de nosso País,

em suas mãos: até que eu tenha lavado as minhas em água corrente,

seria um pecado para mim, vindo de tal luta

e matança recente, tocá-los.

Enéias, detém dois componentes importantes da pietas, a devoção à família e aos deuses. A preocupação com o bem-estar de sua gens também é prova de sua pietas. Ao aportar no norte da África, após uma tempestade (Livro I), busca um terreno elevado para avistar sobreviventes dos outros navios de sua frota. Em seguida, dedica-se à caça, assegurando de abater carne suficiente para todos os que o acompanham. Consciente do abatimento de seus seguidores, Enéias esforça-se para confortá-los, ocultando suas próprias ansiedades. Em muitos aspectos, Enéias encarna o líder romano ideal: capaz de assumir o comando, mas preocupado com o bem maior do grupo, e não com seus próprios interesses pessoais. 

Apesar das pietas inerentes de Enéias, ele muitas vezes é vítima de suas próprias emoções e sucumbe ao furor. Durante o saque de Tróia, apesar das repetidas mensagens dos deuses, ele é freqüentemente dominado pela luxúria da batalha e pelo desejo de se vingar dos gregos, e só quando sua mãe deusa intervém que ele aceita seu destino de salvar os sobreviventes de sua pessoas e encontrar um novo lar. Da mesma forma, no norte da África, ele se apaixona apaixonadamente pela rainha cartaginesa Dido, é a "loucura" do amor que faz Enéias esquecer temporariamente sua viagem e ficar em Cartago. O caso de amor de Enéias e Dido é descrito em termos que evocam furor, com imagens de fogo e tempestades. Mas o maior conflito no poema entre furor e pietas vem bem no final.

Quando Enéias chega à Itália, ele inicialmente recebe uma recepção calorosa da população local (os latinos), cujo rei, Latinus, predestina Enéias a se casar com sua filha Lavínia. No entanto, outro príncipe italiano, Turnus, também deseja casar com Lavínia, fica furioso com a chegada dos troianos e, instigado pela deusa Juno, provoca uma guerra entre os itálicos e os troianos. A segunda parte da Eneida narra os acontecimentos desta guerra e, quando chegamos ao último livro do poema (Livro 12), encontramos muitos jovens personagens solidários que perderam a vida. Neste ponto do poema, Turnus matou o jovem amigo de Enéias, Pallas, e Enéias foi dominado pela fúria e pela tristeza. No Livro 11, houve uma breve trégua entre os dois lados, para permitir-lhes reunir os cadáveres e pranteá-los, e Enéias propôs que ele e Turnus se encontrassem em um combate individual para resolver o conflito, mas a trégua foi quebrada. antes que uma decisão pudesse ser tomada.

No início do Livro 12, Turnus decide enfrentar Enéias em um combate individual, e um tratado solene é redigido segundo o qual ambos os lados respeitarão o resultado do duelo. No entanto, os seguidores de Turnus estão descontentes com este acordo, e são instados pela irmã de Turnus, a deusa Juturna, a quebrar o tratado e atacar os troianos enquanto eles estão desprevenidos. Enéias tenta impedir que seus homens participem da luta, mas é ferido por uma flecha perdida, enquanto Turnus se junta à batalha com entusiasmo. Mas quando Enéias é curado magicamente por sua mãe, a deusa Vênus, e retorna à luta, Turnus percebe que deve poupar seu povo de mais sofrimento e então concorda em um duelo novamente. O rei e a rainha dos deuses, Júpiter e Juno, que têm observado os acontecimentos desde os céus, concordam entre si que a guerra deve terminar agora, e Juno concorda em desistir de seu apoio a Turnus e de seu ódio pelos troianos, que irão casar com os italianos e tornarem-se romanos.


Resumo da Eneida

Canto I

A Eneida principia com uma tempestade furiosa, ordenada pela Deusa Juno, quando Eneias parecia próximo de alcançar o fim de sua jornada, a Itália. O ódio de Juno permeia toda a Eneida. Virgílio aponta as duas razões para tal: ela havia apoiado os gregos contra os troianos, dos quais Eneias fez parte durante a Guerra de Troia. E, acima de tudo, Eneias estava destinado a fundar Roma, que destruiria Cartago, cidade amada por Juno. Esta cena de tempestade pode ser comparada à do Canto V da Odisseia, onde Netuno levanta uma tempestade enquanto Odisseu está à vista de Corcyra. Aqui, porém, os papéis se invertem: como Eneias não é grego, mas troiano, Netuno não se apresenta como adversário, mas sim como um aliado, e é ele quem força Éolo a acalmar a tempestade.

Desembarque na Líbia e a intercessão de Vênus:

Os troianos então pisaram na Líbia e partiram para caçar. Após a refeição, Eneias se mostra preocupado com o destino dos demais navios de sua frota (apenas sete barcos haviam conseguido atracar na Líbia). Vênus então intercede junto a Júpiter, a fim de garantir o futuro dos troianos resgatados. Este último a tranquiliza sobre o futuro de Eneias. Ele previu as guerras que Eneias teria que travar no Lácio, a fundação de Alba, a história de Rômulo e Remo, e a ascensão ao trono do imperador Augusto.

Viagem a Cartago e encontro com Dido:

Posteriormente, Eneias e seus companheiros viajaram para Cartago, que não estava distante de onde seus navios haviam atracado. Eneias e seus companheiros decidem então conhecer Dido, a rainha da cidade. Esta era originária de Tiro, onde se casou com Siqueu, um rico comerciante fenício. No entanto, este último foi assassinado pelo rei Pigmaleão, irmão de Dido, que tinha ciúmes de suas riquezas. Dido, então, decidiu fugir, junto com seus companheiros e o dinheiro de seu marido. Ela então foi para a costa da Tunísia, onde fundou Cartago.

Chegada ao palácio e banquete:

Chegando ao palácio, Eneias então encontra alguns de seus companheiros, que haviam sobrevivido ao naufrágio. Os troianos são bem recebidos por Dido, que os convida para um grande banquete à noite.

Depois das libações rituais, a rainha, apaixonada por Enéias, pede que lhe conte sobre suas aventuras.


Canto II: A Narrativa de Enéias: A Queda de Tróia

Enéias narra a queda de Tróia e suas provações:

Os Cantos II e III da Eneida apresentam uma narrativa embutida: Enéias, a pedido da rainha Dido, narra o saque de Tróia (Canto II) e as provações que enfrentou desde então (Canto III).

A artimanha do cavalo de Tróia:
A história da captura de Tróia inicia com o episódio do cavalo de madeira: Odisseu e outros guerreiros gregos se escondem dentro de um cavalo colossal, "tão alto quanto uma montanha" (instar montis equum), enquanto o restante do exército grego se oculta na ilha de Tenedos, à vista de Tróia. Simulando sua retirada, os gregos induzem os troianos a levar o cavalo para dentro da cidade, acreditando ser uma oferenda aos deuses.

A queda de Tróia e a fuga de Enéias:
Ao cair da noite, Odisseu e seus homens saem do cavalo, abrem os portões da cidade por dentro e incendeiam Tróia. Em meio ao ataque, Enéias, em sono profundo, é visitado por Heitor em um sonho. O espectro anuncia a queda de Tróia e ordena que ele salve os penates e fuja. Despertado pelo clamor da batalha, Enéias ignora os avisos de Heitor e, ao presenciar sua cidade em chamas e entregue aos gregos, decide lutar até a morte ao lado de seus companheiros. No entanto, sua mãe Vênus o visita e o persuade a fugir com alguns homens, levando consigo Anquises, seu pai, que carrega nas costas, sua esposa Creusa e seu filho Ascânio (Iule). Apesar de seus esforços, Enéias é incapaz de salvar Creusa, que é morta por um grego após se separar do grupo.


Canto III: Conto de Enéias: A Viagem

A Jornada de Enéias: Destino Revelado

Após a fuga de Tróia, Eneias empreende uma árdua jornada. Em seu périplo, busca um novo lar para o povo troiano, guiado por oráculos e visões divinas.
Em Delos, Eneias consulta o oráculo do deus Apolo, buscando saber onde fundar a nova Tróia. O oráculo profetiza que será na terra ancestral dos troianos.

Interpretação errônea e viagem a Creta:
Inicialmente, Eneias interpreta mal a profecia, segue para Creta, acreditando ser a terra natal de Teucro, o progenitor dos troianos, mas logo percebe que não é o destino final.

Os Penates intervêm e lhe revelam a verdade:
Os Penates, deuses protetores da família troiana, intervêm e revelam a Eneias o verdadeiro significado da profecia. A terra profetizada é o Lácio, na península itálica, terra natal de Dardano, genro de Teucro e fundador de Tróia.


Canto IV: Amor de Eneias e Dido

Dido e Eneias: Amor e Destino 

Dido, persuadida por sua irmã Ana, entrega-se ao amor por Eneias, olvidando o voto de fidelidade ao esposo morto pelo irmão Pigmaleão.
Rumores do romance espalham-se por Cartago. Iarbas, pretendente de Dido, indignado, implora a Júpiter que intervenha. Júpiter envia Mercúrio a Eneias, lembrando-lhe do destino traçado: a Itália.
Dido, ao perceber a partida iminente de Eneias, tenta retê-lo em vão. Surdo às súplicas, Eneias parte à noite com seus companheiros rumo ao Lácio.
Dido, ao despertar e notar a ausência de Eneias, decide suicidar-se. Amaldiçoando Eneias, Dido põe fim à sua vida. Juno, compadecida, acalma sua dor.
No reino dos mortos, Eneias reencontra Dido, mas ela, fiel ao esposo, o ignora.


Canto V: Escala na Sicília e jogos fúnebres

Eneias na Sicília: Tempestades, Jogos e Destino 

Uma tempestade implacável obriga Eneias e seus companheiros a desembarcarem na Sicília. Aceste, troiano de origem, reina na ilha, onde jaz enterrado Anquises, pai de Eneias, morto há um ano.
 Eneias celebra rituais fúnebres e organiza jogos em sua memória. Regatas, corridas, lutas e arco e flecha preenchem a canção.
Juno, inimiga de Eneias, incita Íris a explorar o cansaço das mulheres. Disfarçada como mortal, Íris incita as mulheres a incendiar os navios de modo a forçar os homens a se estabelecerem permanentemente na ilha. Júpiter intervém com chuva, salvando a frota.
Um companheiro, inspirado por Palas, sugere deixar os fracos na Sicília e partir para o Lácio. Anquises aparece em sonho a Eneias, apoiando o conselho e recomendando a visita à Sibila de Cumae. A Sibila guiará Eneias ao Submundo para um encontro com o pai. Eneias parte para Cumae sob a proteção de Netuno, mas o piloto Palinuro morre para salvar a todos.


Canto VI: A Descida de Eneias ao Submundo

A descida ao submundo, a catábase, é uma das passagens mais famosas do épico. Uma viagem iniciática, onde Enéias, guiado pela Sibila, adentra no mundo dos mortos, tomando contato com seus ancestrais, mas, também com seus, futuros, descendentes. A sua Grei.

Chegando em Cumae, Enéias vai para a Sibila. Ela confirma a ele que ele alcançará seus objetivos após provações e guerras. Ele pede que ela o ajude a entrar no submundo para encontrar seu pai Anchises. Sibila o aconselha a levar um ramo de ouro para ofertar a alguém venerável, Caronte. O barqueiro é assim distinguido não só pela idade avançada como pelo labor que desempenha a favor dos deuses junto às almas. O ramo, seria uma paga/recompensa para Caronte e um instrumento, ou meio, de crença para Enéias alcançar o que deseja ­ ver seu pai.

Ele perpassa as diferentes regiões do submundo, até os Campos Elíseos, aonde se encontra com seu pai: Anquises, que mostra a Eneias seus futuros descendentes: os reis de Alba, Rômulo (fundador de Roma), seus sucessores, Bruto, o Velho, Pompeu, Júlio César e, finalmente, Augusto, chamado a fundar um poderoso Império. Eneias então torna à superfície, e parte em direção ao Lácio.


Canto VII: A Chegada ao Lácio

O Livro VII abre uma segunda parte da epopeia: a história das viagens de Eneias é substituída pela das guerras no Lácio.

Os troianos chegam ao Lácio. Em uma observação de Ascânio, Eneias entende que as profecias do oráculo se cumpriram, que chegaram à terra profetizada (cano). Oráculos deixam claro para o rei local, Latinus, que ele deve casar sua filha Lavínia com Enéias, e não com Turno, o belo e jovem rei dos Rutuli.
Juno, para atrasar o destino, envia a fúria Alecto, que desperta ódio contra os troianos entre a esposa de Latinus, Amata, e entre os camponeses latinos. Almon, um jovem escudeiro de Latinus, é fatalmente atingido por uma flecha durante a luta com os troianos. A porta de Jano se abre contra a vontade do rei, e a guerra irrompe.


Canto VIII - Turno, Eneias e a Busca por Aliados 

Turno, resoluto a guerrear contra os troianos, convoca reforços das cidades vizinhas.
Em sonho, Eneias recebe a visita do deus Tiberino, que o tranquiliza sobre seu futuro e o aconselha a se aliar a Evandro, líder dos Arcadianos no Monte Aventino.
Despertando, Eneias encontra em Evandro um lar para os troianos e o apresenta a seu filho Pallas.
Evandro e Eneias buscam aliados. Evandro propõe a Eneias liderar os etruscos de Agylla, libertos do tirano Mezêncio, refugiado com Turnus.
Os etruscos, em pé de guerra, exigem o rei e sua tortura, aguardando apenas um líder estrangeiro para atacar, segundo um oráculo.
Evandro fornece a Eneias um contingente de cavaleiros Arcadianos liderados por Pallas, enquanto Eneias escolhe os mais valentes de seus companheiros.
Os aliados se dirigem ao líder etrusco Tarchon, para cujo filho Vênus traz armadura. Ela pede a Vulcano que forje um escudo para Eneias, adornado com cenas da história de Roma, desde Rômulo até a Batalha de Actium.
O motivo do escudo, como o da tempestade e do catalisador, remete aos épicos homéricos (cf. escudo de Aquiles na Ilíada).


Canto IX

Juno aconselha Turno a atacar os troianos entrincheirados em seu acampamento, enquanto Enéias, com Evandro, está fora para encontrar alianças. A luta parece se voltar para a vantagem dos latinos, apesar do heroísmo de Euríale e Niso, que deixam o acampamento à noite para procurar Enéias: eles são mortos antes de completar sua missão. Ascânio participou da guerra pela primeira vez, e mostrou seu valor matando Numanus, cunhado de Turno. Durante a batalha, os troianos abriram as muralhas da fortaleza, mas as fecharam em Turnus, que conseguiu escapar pulando no Tibre do topo das muralhas.


Canto X

Os deuses, vendo o que está acontecendo no Lácio, decidem se encontrar no Olimpo. Vênus pede a Júpiter que poupe os troianos, enquanto Juno acusa Vênus de desencadear toda essa violência. Júpiter não toma partido.
Por sua vez, Eneias navega para o acampamento de Tróia, acompanhado por seus aliados etruscos e latinos contrários a Mezêncio.
A batalha foi sangrenta e os massacres se sucederam. Quando Turnus consegue matar Pallas, Eneias entra em fúria negra. Para salvar Turnus em perigo, Juno cria um fantasma na imagem de Enéias, que ela dirige para a frota dos Rutuli, e faz com que Turnus o siga. Uma vez que Turnus está a bordo de um navio, ela faz o fantasma desaparecer e o barco zarpa.
Mézence, então, assumiu o comando. Atacando Enéias, ele joga seu dardo nele, que salta do escudo de seu alvo. Eneias então revida, e fere Mezêncio. Lauso, filho de Mezêncio, então decide cobrir a retirada de seu pai, e desafia Enéias, que o mata. Quando Mézentius, que se refugiou mais longe, fica sabendo da morte de seu filho, ele decide, embora ferido, voltar atrás e confrontar Eneias para vingar seu filho. Eneias também o mata com uma espada na garganta.


Canto XI

Os latinos foram divididos em dois campos: de um lado, os partidários de Drances, hostis à guerra, e do outro, os da rainha Amata, favoráveis a Turno. Eneias recebeu Drancès e anunciou sua intenção de fazer uma trégua para honrar os combatentes que haviam perecido durante a batalha. Também insiste em seu desejo de fazer a paz, acusando Turnus de iniciar a guerra.
Turnus, ao saber que os troianos estavam se aproximando da cidade, lançou um novo ataque. As duas cavalarias se enfrentaram e, depois de amargas lutas, os latinos finalmente tiveram que se retirar para sua cidade; Aqueles que não puderam se refugiar antes das portas se fecharem foram impiedosamente massacrados. Turnus consegue voltar a coberto da noite.


Canto XII

Eneias e Turno decidem resolver o conflito em combate único. No entanto, pressionados por Juturno, os italianos interviram na luta, contra as regras, o que provocou uma nova batalha: uma flecha atingiu Enéias. Curado por uma intervenção discreta de Vênus, Eneias consegue fazer com que Turnus retome o combate individual. Ele sai vitorioso. Turnus implora sua misericórdia. Enéias, a princípio tentado a concedê-lo, vê o arreio roubado do jovem Pallas morto por Turno: indignado, Eneias dá o golpe de misericórdia ao chefe de Rutula. O épico termina com uma cena de violência no final da qual Eneias mata um inimigo indefeso. No entanto, acredita-se que a obra esteja inacabada.




Artigos correlatos:



sábado, 30 de outubro de 2021

A Pátria Acima dos Nossos Interesses Pessoais - Lições Para o Presente.

 O Juramento dos Horácios (1784), obra do pintor francês Jacques-Louis David. Os
três irmãos Horácios, fazendo a saudação "romana"/ibérica, jurando lutar pela República Romana, embora sua decisão traga sofrimento a sua família. A pintura simboliza o princípio segundo o qual o dever público, o sacrifício pessoal, o patriotismo e a defesa das convicções tomadas em consciência são valores superiores à própria segurança, ou seja, aos seus interesses.

Pelos anos de 670 a.C., durante o reinado de Túlio Hostílio, os romanos declararam guerra aos albanos, seus parentes próximos. Devido a proximidade desses laços, quando ambos exércitos se encontravam em campo aonde seria travada a batalha, o rei romano Túlio Hostílio e o rei de Alba Longa, pactuaram  pela realização de um único combate, afim de evitar a aniquilação de um ou outro lado. Ao saberem haver trigêmeos tanto do lado dos albanos, os irmãos Curiácios, como dos romanos, os Horácios, decidiram que as duas tríades lutariam por suas respectivas pátrias.  

Iniciado o combate, os três irmãos Curiácios foram feridos, ao custo da morte de dois dos irmãos Horácios. Restando Públio, o último Horácio vivo, tendo de lutar contra os três Curiácios. Públio, porém, não se encontrava ferido, ao passo que o três Curiácios já sangravam.

Públio ponderou que não conseguiria enfrentar os três ao mesmo tempo, então correu, se afastando dos três. Um dos Curiácios, menos ferido, conseguiu perseguir mais efetivamente Públio, ao passo que um outro dos irmãos Curiácios, ficou mais para trás, e o terceiro, mais gravemente ferido, já havia caído muito para trás. Com os três irmãos Curiácios separados, Públio voltou-se contra o Curácio que o havia perseguido e o matou. Então, ele encontrou o segundo irmão e também o matou sem dificuldade. O terceiro irmão, gravemente ferido, não era páreo para o saudável Públio. Ao encontrá-lo, Públio declarou que havia matado os dois primeiros para vingar a perda de seus próprios irmãos, e que agora o mataria por Roma, enterrando sua espada no pescoço do último dos Curácios.

Públio foi recebido em Roma com grande festa, porém, ao contrário de todos na cidade, Camila, sua irmã mais nova, chorava desconsoladamente. O regresso triunfal de seu irmão significava que todos os Curiácios estavam mortos. Camila, sem ninguém saber, em segredo, havia noivado com um dos Curiácios. Ao entender o que se passava, Públio desembainhou sua espada e transpassou o coração de sua irmã, silenciando as comemorações, ao que disse:

"Marche com seu amor a sem tempo para se reunir com seu noivo, já que esqueceste teus irmãos mortos e do que está vivo, como esqueceste tua pátria. Morra da mesma forma qualquer romano que chora um inimigo".

Públio foi preso, julgado, e condenado por assassinato e sentenciado à morte. Porém, seu pai, deu um passo à frente e suplicou pelo filho, dizendo que sua filha mereceu morrer, e que se não fosse seu filho, ele próprio a teria matado. Além disso, alegou que já havia perdido seus dois outros filhos, e que seria injusto privá-lo do terceiro. O povo, comovido pelas lágrimas do pai e dobrados pela valentia do jovem, lhe perdoou a vida. Entretanto, obrigou a família a purgar o crime com um sacrifício que se manteve durante séculos, que recebeu o nome de: “tigillum sororium”.

O episódio encerra vários ensinamentos....  os albanos Curácios, enquanto lutaram juntos, quase aniquilaram os irmãos romanos Horácios, quando lutaram dispersos, foram eles os aniquilados. Eis o simbolismo prático do fascio romano. A sentença propagada, repetidamente, por maçons e liberais, seus filhos diletos: "unidade na diversidade" é uma hedionda mentira! Quanto mais plural uma "sociedade" mais tênue são seus laços, e consequentemente, sem unidade, tornam-se presas fáceis de forasteiros, resultando, se não no seu extermínio, na sua subjulgação por uma nação mais forte, não por acaso, mais homogênea. Quando uma nação estrangeira subjulga a uma outra, há dois caminhos reservados a subjulgada, o seu extermínio, seja pela assimilação ou pela pura e simples completa destruição, ou é mantida dividida, para que assim não possam reajir eficazmente contra seus algozes. Assim ensina todo curso da história humana. 

A formação brasileira, ao contrário do que propaga a imprensa estrangeira aqui estabelecida, não ocorreu sob a base de uma sociedade multicultural, essa versão é promovida em todos os países em que as forças maçônicas se infiltram em suas instituições, de universidades, à imprensa, poderes políticos, etc... mas ante uma poderosa unidade nos legada pelos portugueses. Os normando-franceses antecederam os portugueses em 30 anos no Brasil, estavam melhor estabelecidos do que os portugueses, quando esses, alarmados, resolvem tomar posse definitiva da terra. Porém estavam os franceses fragmentados em questões religiosas, corroídos pelo protestantismo, além de tampouco terem unidade linguística, do qual padecem, mesmo na atualidade, e assim quando os portugueses levantam armas contra seus rivais, esses já se encontravam enfraquecidos por brigas internas. 

O imperialismo, por intermédio de uma oligarquia que saiu vencedora na segunda guerra, vem promovendo metodicamente essa política fragmentária. O processo de "descolonização" da África segue essa política, repetição das falsas independências dos países hispano-americanos. Como a difusão do islamismo na África austral, e das seitas neopetencostais na ibero-américa. Além de religiões minoritárias na Ásia. 

E eis a realidade ante seus olhos. A China vem promovendo abertamente em "sua" província de Xinjiang, de população uigure, que são tanto religiosamente, quanto racialmente e linguisticamente dispares dos chineses, políticas abortivas e de esterelização dessa população, além de uma política francamente assimilatória de imposição da língua e toda cultura chinesa, com o transplante de migrantes chineses de suas provincias orientais para a região. Alguma semelhança com oque se passa no ocidente.... ?

"Geração Identitária" movimento difundido por 
toda Europa que tem como bandeiras a
anti-imigração e o fomento de identidades locais,
com fins separatistas.
O método na atualidade é ainda mais sutil, embora não haja nada de novo. Ao fomentar a imigração ilegal, os próprios fomentadores, criam falsas "oposições", dirigidas, controladas por eles. Afim de evitar o fortalecimento do nacionalismo, que é o grande inimigo dos imperialistas. Tem-se fomentado o surgimento de minorias étnicas, separatistas.... na década de 40 já haviam feito algo similar com o apoio do strasserismo, segmento dissidente do Nacional-Socialismo, que defendia a fragmentação da Alemanha em suas respectivas etnias regionais, oque por óbvio levaria a dissolução da Alemanha. Otto Strasser foi financiado, no curso da guerra, em seu exílio pelos aliados, e mesmo após. A Rússia faz algo similar, via Aleksander Dugin, ex-fundador do Partido Nacional-Bolchevique, extinto pelo Putin, o "strasserismo russo". Partidos anti-imigração, mas, paradoxalmente liberais, surgem ao sabor do vento, eis o Vox na Espanha, a AfD - Alternativa para a Alemanha, Liga Norte na Itália, apenas para ilustrar.

Os que aderem ao credo do inimigo, que fomentam identidades locais, separando irmãos, renegam seus ancestrais, se dissociam de sua linhagem, e consciente ou inconscientemente são promotores da destruição da nacionalidade. Como no episódio romano, dos Horácios, em que a irmã se bandeou para o lado do inimigo, fica a lição de como traidores devem ser tratados. 

Artigos Correlatos:




terça-feira, 12 de maio de 2020

CASTILHISMO, Uma Filosofia Estóica.

A influência do estoicismo sobre a tradição ocidental é enorme, incluso na constituição do próprio cristianismo. Pode-se afirmar sem engano que dentre todas as escolas filosóficas ocidentais, foi a que mais tempo vigeu e que mais gozou de popularidade. Ressurgindo com vigor no Renascimento, sendo determinante na nossa formação nacional, sobre a qual cuidaremos em artigo próprio oportunamente. Por hora, nos focaremos na influência do estoicismo sobre o positivismo, que de todas correntes filosóficas modernas é a com qual mais guarda correlação.
Editorial


O Positivismo enquanto filosofia é um desdobramento natural do Estoicismo. Ambos se enquadram na Filosofia Natural. Os estóicos apresentavam uma visão una do cosmos, consistindo de uma lógica formal, uma física monísta e uma ética naturalista. Os estóicos negam qualquer realidade que seja puramente espiritual, de modo que a capacidade de agir e de padecer, pertence somente ao que é corpóreo e material. O ser é entendido como corpóreo e material. Assim como Aristoteles, o estoicismo é radicalmente empirista, acreditando que a existência (einai) se compõe apenas de corpos que interagem das mais diversas maneiras. Tudo que existe é corpo: eis a afirmação básica do materialismo estóico. Assim o cosmos é um sistema uno, contínuo, belo e racional, diferente da concepção platonista, para quem a matéria é indigna de integrar o corpo de Deus. Oque leva, a um paradigma: ou o mundo é uma criação imperfeita de Deuses intermediários, tese dos neoplatônicos, ou seria resultado de um "Deus malévolo" como afirmam o gnósticos. Ambas deduções, rejeitadas pelos estóicos.

Dessa concepção da physios implicava uma visão determinista das coisas, posto que o cosmos segue uma ordem. Não existem acasos na natureza, tudo caminha para um fim. E como o universo caminha para um fim, também a existência humana tem uma finalidade, um teleíos, um objetivo final. E qual seria esse objetivo final? Segundo os estóicos, o objetivo do homem era viver em conformidade com a natureza, transpor para dentro de si mesmo essa ordem manifesta externamente. O Positivismo igualmente é empirista e determinista, e claramente, parece ter se baseado nessa concepção estóica, de que as leis naturais, em seu sentido amplo, regem as relações humanas. Difere do estoicismo, no método para inteligir qual seria essa ordem natural, os estóicos se baseiam na razão, único recurso conhecido à época, já o positivistas se valem da metodologia científica. 

Uma vez que tudo se encontra ordenado pelo Lógos, e sendo o homem parte desse Lógos, fragmento e um momento do Lógos. Compete-lhe então agir sempre em obediência à lei universal, buscando viver em harmonia com a natureza. Portanto, a physis característica do homem é o Lógos, a razão, e como o fim de todo ser é atuar a própria physis, assim o objetivo e fim do homem será atuar a razão; e, por conseqüência, dos modos e das maneiras nas quais a razão atua perfeitamente devem-se deduzir todas as normas da conduta moral. Dessa concepção, decorre toda a ética estóica. 

Para fundamentar isso, encontrar uma base em que se assentasse toda sua concepção ética, assumiram uma atitude que cada um de nós pode assumir, consideradas quatro virtudes capitais, que seriam a base de toda a existência:
1. Apatheia (apatia); o homem deve dominar a si.
2. Autarkia (autarquia); o homem deve buscar a auto-suficiência, a ausência de necessidade.
3. Obediência; uma vez que tudo se encontra ordenado pelo logo universal, compete ao homem agir sempre em obediencia a lei universal.
4. Dever; o homem ao se relacionar através do logos, implica necessariamente em deveres. 
A primeira apathéia, "apatia", não deve ser mal compreendida com o sentido que se dar ao termo na atualidade. A apatia a que se referiam os estóicos não era uma atitude passiva diante da vida, muito pelo contrário. O que pretendiam era que o homem empreendesse uma luta contínua e constante para dominar o seu ser, para mantê-lo sob as rédeas da razão. E nessa luta o objetivo a ser atingido era não deixar-se dominar por fatores externos, não ser o homem influenciado pela dor e pelo sofrimento, nem pelo prazer. Isso não significa tornar-se insensível à dor ou ao prazer, como às vezes se afirma; mas sim tornar-se imperturbável perante esses elementos, que têm ambos caráter essencialmente transitório. O sofrimento é sentido, o prazer é usufruído, mas o primeiro não deve abater o homem, nem deve o segundo enleá-lo. Para se chegar a esse nível de consciência, para agir de acordo com essa norma, é preciso muita ascese, muito exercício, necessidade de prática constante.

A segunda virtude capital era a autarquia, isto é, a carência de necessidade. É a auto-suficiência do sábio, para quem a felicidade não consiste em outra coisa a não ser a vida virtuosa. Nesse sentido podemos citar a Epícteto, quando dizia: "deseja só aquilo que de ti depende". Trata-se aqui da excessiva importância que costuma-se atribuir a certas coisas, considerando-as às vezes, erroneamente, indispensáveis para o nosso bem-estar. E isso fica bem patente nos dias de hoje, em que vivemos sob o domínio de uma imensa "religião", que é o consumismo, cuja "liturgia" é a propaganda. É um "bombardeio" constante de informações acerca do perfume que se deve usar, das roupas que se deve vestir, etc. Passando o homem a considerar, como se fossem importantes e necessárias, oque são em verdade perfeitamente dispensáveis ou de importância apenas secundária. Se analisarmos bem, perceberemos que existe muito pouca coisa de que realmente necessitamos.

A terceira virtude, é a obediência. Uma vez que tudo se encontra ordenado pelo Logos universal, e sendo o homem partícipe desse Logos, compete-lhe então agir sempre em obediência à lei universal, buscando viver em harmonia com a natureza. E neste caso não se deve entender a natureza apenas em seu aspecto físico, como costumam conceber os "ecologistas" da atualidade, mas sim num sentido mais amplo, abarcando praticamente todas as atividades do homem: as interações entre os diversos segmentos sociais, as formulações de índole política, o florescimento, mediante a educação, das potencialidades individuais inerentes ao ser humano. Em todos esses casos existem ordenamentos, leis, ditames naturais, cujo não cumprimento traz ao homem conseqüências às vezes desastrosas. "Se quisermos sujeitar a natureza, cumpre obedecê-la primeiro." - Francis Bacon.

Finalmente, a consciência do dever; quarta virtude do ideário estóico. Através do Logos o homem se relaciona com todos os outros homens, e essa relação implica, necessariamente, em deveres. Mesmo sem recorrer a grandes especulações, intuímos e somos impelidos ao sentimento de ajuda mútua, ao sentimento pedagógico, pois que a cada homem, em cada instante, se apresenta uma oportunidade de ensinar ou aprender alguma coisa. Enfim, sentimo-nos com a obrigação de colaborar de alguma forma, com a obra que é de todos os homens, sentimo-nos compromissados com a finalidade última da humanidade.

Essa consciência do dever, aspecto essencial dentro da fílosofía estóica, era também uma característica da civilização romana. Temos um dever perante a família, a pátria, a humanidade, perante a história. Daí o lema positivista: "Família, Pátria e Humanidade". É bom ter isso em mente quando confrontamos a nossa extrema preocupação pelos direitos do homem; não podemos esquecer a complementariedade desses dois elementos: nossos direitos só se justificam na medida em que assumimos e cumprimos com os nossos.

Sobre essas quatro virtudes básicas assentavam os estóicos a sua idéia de liberdade. Qualquer coisa que se relacione com disciplina, obediência, auto-esforço, etc., costuma ser considerado contrário à idéia de liberdade. No entanto, segundo o Estoicismo, a liberdade é personificada na figura do sábio, que cultiva as quatro virtudes já referidas: é livre de afetos e paixões e se basta plenamente a si mesmo; age em conformidade com a harmonia universal e tem consciência de seu dever - para consigo mesmo e para com a sociedade.

A grande força dos estóicos consistiu precisamente na capacidade que demonstraram de não apenas falar, não só estudar os princípios nos quais devemos basear nossa existência, mas pô-los em prática, já que de nada adianta o conhecimento sem vivência, a ciência sem virtude. Se a meta do homem é a conquista da felicidade, os estóicos entendiam essa felicidade exatamente como a vivência prática da virtude. Por isso ao homem é possível ser livre e autosuficiente: porque, para praticar a virtude, não dependemos de mais ninguém a não ser de nós mesmos.




Artigos correlatos:

Eneias, o Modelo Romano do Homem Ocidental
Estoicismo e a Virtus Romana, Perda e Queda.