"Do estudo da história podemos também aprender como um bom governo deve ser fundado; pois enquanto todos os imperadores que acederam ao trono por nascimento, exceto Tito, foram ruins, todos que acederam por adoção foram bons, como foi o caso dos cinco de Nerva até Marco. Mas tão logo o império caiu novamente nas mãos dos herdeiros por nascimento, sua ruína recomeçou".
Niccolo Maquiavelli
Maquiavel se reporta ao período de 138 à 192 D.C., conhecido como 'os cinco bons imperadores', quando cinco imperadores romanos: Nerva, Trajano, Adriano, Antonino Pio e Marco Aurélio/Lúcio Vero, se sucederam por indicação (adoção) e não por hereditariedade. Um repúdio consciente do princípio da herança dinástica e considerado como um dos fatores para a prosperidade do período.
Esse período tem início após o assassinato de Domiciano, quando então o senado nomeia Nerva como imperador romano. No que pese sua meia idade e não ter descendentes, Nerva era considerado um homem capaz, quer do ponto de vista militar quer administrativo, mas sobretudo racional e confiável. A falta de filhos se revelou uma vantagem, pois a sua sucessão foi determinada pela virtude do candidato e não por critérios familiares, embora Trajano tenha sido formalmente adotado por Nerva. Assim, os imperadores que o sucederam: Trajano, Adriano e Antonino Pio seguiram a mesma política de nomear o sucessor mais apto, o que resultou num período de estabilidade conhecido como os cinco bons imperadores.
1. Nerva; 2. Trajano; 3. Adriano; 4. Antonino Pio; e 5. Marco Aurélio/Lúcio Vero |
Durante o reinado destes cinco homens, Roma prosperou e atingiu o seu auge civilizacional. Trajano foi o responsável pela extensão máxima do Império em 117, ao estender a fronteira oriental até incluir a Mesopotâmia na alçada de Roma. O seu sucessor, Adriano, soube manter o vasto império e reconhecer que não valia a pena estendê-lo mais. Dando as conquistas por encerradas e construiu a 'muralha de Adriano' no norte de Bretanha como símbolo do fim do Império. Este período de manutenção, por oposição à conquista, ficou conhecido como Pax Romana.
"Se um homem fosse convocado escolher um período da história do mundo durante o qual a condição da raça humana foi mais feliz e próspera, ele iria, sem hesitar, escolher o que se passou entre a morte de Domiciano e a ascensão de Cômodo. A vasta extensão do Império Romano era governada pelo poder absoluto guiado pela virtude e pela sabedoria. Os exércitos eram contidos pela firme, mas gentil, mão de quatro sucessivos imperadores cuja personalidade e autoridade comandavam respeito. As formas da administração civil foram cuidadosamente preservadas por Nerva, Trajano, Adriano e os antoninos, que se deleitavam com a imagem da liberdade e gostavam de se ver como ministros responsáveis pelas leis. Tais príncipes mereceriam a honra de restaurar a república se os romanos da época fossem capazes de gozar uma liberdade racional." - Edward Gibbon.
O ciclo de prosperidade terminou quando Marco Aurélio designou, para sucessor, não o homem mais apto, mas o seu filho Cómodo, que se sabia pouco à altura do pai e seus antecessores. Como na dinastia Julio-Claudiana (Nero) e Flaviana (Domiciano), um período de prosperidade chegou ao fim, seguido por uma governação errática por um homem paranóico, Cómodo, que incentivaria a revolta dos seus súditos. Cómodo foi assassinado em 192, mas o Império caiu numa grave crise dinástica e social.
A sucessão por indicação (adoção) e não por hereditariedade não era em si uma novidade, imperadores romanos adotaram herdeiros no passado: o imperador Augusto adotou Tibério e Cláudio adotou Nero. Júlio César, que se auto-proclamou dictator e que pois fim a República, adotou Otaviano, que seria conhecido como Augusto, o primeiro imperador de Roma, mesmo tendo, um filho ilegítimo, Cesarião, com Cleópatra. A "novidade" que marcou esse período esta no critério de escolha do sucessor, além da não-hereditariedade. Ao passo que nos episódios passados, a sucessão era algo circunstancial e principalmente, sem maior critério, exceto o da afinidade pessoal entre o imperador e seu sucessor, com Nerva passa a influir de modo decisivo a capacidade de governança do sucessor. Havia nessa escolha um critério ideológico, de escolher o homem mais apto ao cargo, que fosse sábio e racional, e assim, impinge-se essa marca ao seu governo.
Outros episódios históricos, podem ser aludidos, como paralelos, embora mais sirvam como diferenciação, como é o caso do Reinado Visigótico na Hispania. A sucessão dos Reis Visigodos, não ocorriam por hereditariedade, mas por eleição por uma casta visigoda. E por assaz, não raro, se dividiam em facções, e raro era um Rei Visigodo que terminava seu reinado de morte morrida e não matada. Além, claro, de não haver nenhum critério ideológico em sua escolha, se não, o atendimento de interesses da facção a que era ligado. E eis aí uma grande virtude que distingue o período dos '5 bons imperadores' do regime visigótico. Como o Imperador romano não se submetia ao senado, ou a qualquer outro órgão de consulta para sua escolha, isso não fomentava facções, ao mesmo tempo que lhe dava liberdade de escolha, e sobretudo, independência para governar em favor do bem comum e não em atendimento aos interesses de uma oligarquia.
Observe o paralelo entre o período dos '5 bons imperadores romanos' com o Regime Castilhista instituído no Rio Grande do Sul - RS entre 1891 à 1937. Seria fruto do acaso, a prosperidade que gozou o Rio Grande do Sul nesse período? Quando se sucedem na presidência do Estado, governantes como: Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros e Getúlio Vargas..... não se trata de capricho do destino! O Partido Republicano Riograndense - PRR, funcionava como escola de formação ideológica dos seus quadros partidários. O PRR nunca foi uma legenda eleitoreira, como crassa hodiernamente no cenário político, e como poucas vezes houve no Brasil, se não é caso único, mas, sobretudo, tinha um forte viés ideológico, em que se destaca o espírito anti-patrimonialista, a racionalização da administração pública, a absoluta probidade e respeito a coisa pública. É desse terreno fecundo que rendia e rendeu valorosos frutos, em que o Chefe partidário, de forma isenta e sem se submeter ao próprio partido, escolhia seu sucessor entre aqueles mais competentes e aptos a governar. E foi assim que Borges de Medeiros sucedeu a Júlio de Castilhos e Vargas a Borges de Medeiros.
1. Júlio de Castilhos; 2. Borges de Medeiros; 3. Getúlio Vargas. |
Esse sistema se complementava com o princípio da continuidade administrativa, consagrada na Constituição Castilhista de 1891, materializada com o instituto da reeleição ilimitada. Que permitia ao Presidente (atual governador) se reeleger mediante quorum qualificado.
A constituição Castilhista, ainda propiciava independência ao Executivo, ao retirar do parlamento o poder de legislar, outorgando esse poder ao Executivo, compreendendo que se trata de um poder a ser exercido por técnicos e não por incompetentes ineptos para tal função (parlamento). Com isso o Executivo não se submetia aos interesses oligárquicos, e se estabelecia uma relação direta com o povo, fazendo prevalecer o interesse público sobre os mesquinhos interesses privados.
As instituições castilhistas guardavam esse traçado por influência de August Commte, que por certo conhecia a fórmula de Maquiavel, que mais longinquamente também era a traçada por Platão. Em verdade, há muito é sabido os tipos de instituições políticas viáveis e exitosas. Se não são postas em prática, a razão simples se dar porque esse tipo de fórmula não atende aos interesses das oligarquias dominantes, que preferem instituições corporativas ou representativas, do qual são derivações o regime parlamentarista seja presidencialista, seja monárquico. Se o regime absolutista de origem monárquico por si só estava longe do ideal, como aponta o próprio Maquiavel, as atuais monarquias parlamentaristas são ainda piores. E mesmo os regimes presidencialistas representativos, são essencialmente regimes oligárquicos que privilegiam a eleição dos cargos públicos mediante o financiamento de campanhas inacessíveis ao cidadão comum, se não, a fantoches de uma plutocracia dominante e do qual mais das vezes quando o poder executivo não é um fantoche dessa plutocracia, se torna refém dela, mediante quase sempre um congresso eleito pela sua mão. No caso dos países sub-desenvolvidos, o caso é mais grave, porque esse poder plutocrático é estrangeiro, ditando políticas contrárias ao interesse nacional.
E em meio a esses sistemas já comprovadamente falidos, o Castilhismo ainda é a vanguarda política do mundo! O farol que alumia e guia em meio as trevas! Um sopro atávico que revivifica a alma!
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Como que os líderes castilhistas conseguiram organizar os interesses de classe e controlar os desejos dos parlamentares da assembléia estadual? Estou perguntando pq vendo a política dos dias de hoje fica difícil de entender como conseguiam ser independentes e técnicos em suas escolhas numa arena tão conturbada que é a política.
ResponderExcluirUnidade ideológica e disciplina hierárquica, sem isso qualquer partido se dissolve em facções.
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