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terça-feira, 30 de abril de 2019

Carlos Nunez, A Descoberta do Brasil Galaico!

"Sempre nos disseram que o Brasil era muito português, misturado com o africano e o indígena, mas mais que  português é galego."
Carlos Nunez

Músico galego Carlos Nunez
Carlos Nunez é um dos mais prestigiados gaiteiros da Galiza, ganhou projeção mundial compondo a trilha sonora da obra cinematográfica "Mar Adentro". Após três anos morando no Brasil, em 2009, lançou seu album "Alborada do Brasil", que reuniu uma gama de artistas como: Caetano Veloso, Adriana Calcanhoto, Lenine, Carlinho Brown, etc..., no qual manifesta as raízes galaicas que encontrou na música brasileira.  Posteriormente, esse trabalho etno musical, rendeu um documentário: "Brasil somos nós". 

Carlos Nunez conta que um dos motivos de sua vinda, foi a procura da história de seu avô que imigrou para o Brasil em 1907, e que havia sido morto no Rio de Janeiro. Aqui descobriu, que seu avô foi um músico bastante influente no Rio na época, que havia constituído uma nova família. 

Durante sua estadia, Carlos Nunez atesta que a pegada galega no Brasil é mais profunda do que a portuguesa. Com a certeza de que o Brasil é a Galiza do futuro, que nos três anos de preparação: "me sentia na minha casa nos dois países: o Brasil era a Galiza, e a Galiza era o Brasil."

Indagado no que o Brasil tinha em comum com a Galiza, diz:  
"O Brasil está cheio de cultura galaica, de fogueiras de São João, noites de luar, orvalho, lobisomem, coroças, luscos-fuscos... Essa Galiza profunda está viva no Brasil, mas pouca gente passou o trabalho de pesquisar o que se passa no terreno musical." 
"Sempre nos disseram que o Brasil era muito português, misturado com o africano e o indígena, mas mais que português é galego. Quando exploramos o terreno musical está claríssimo que aquele Portugal que chegou ao Brasil há 500 anos com instrumentos como a gaita era mais galaico, menos lusitano. O objetivo deste disco é abrir esse grande segredo que esconde o Brasil que no fundo esconde uma Galiza, misturada."
Discorrendo sobre a imagem vendida do Brasil para o exterior, "turística", Carlos Nunez faz um paralelo com a Espanha em que se veiculam a imagem caricata de: "touros, flamengo e futebol". 
"Eu não vim a procura desse lado turístico do Brasil que todos conhecemos. Procurei o lado galego, esse que não teve as oportunidades do outro mais oficial de capoeira, samba e futebol... 
Do Brasil (no exterior) somente se conhece samba, carnaval e futebol, ou seja, o Brasil turístico, e isso não é Brasil, é uma minoria, a maior parte da música brasileira lembra mais daquela música desconhecida do Norte de Portugal, do Norte da Península Ibérica, que para o samba. Este outro Brasil que descobrimos com este disco conecta com esta Espanha. Eu fiquei feliz porque o vice-presidente Fernández de la Vega, recomendou o disco Alborada do Brasil durante uma viagem ao Brasil, quando esteve com Lula poucos dias. Perguntaram-lhe por seus gostos musicais e recomendou especialmente o disco Alborada do Brasil " Puxa, menos mal, por fim, não somente, flamengo!"
Dos lugares em que mais achou ligações com a Galiza e Portugal, Carlos Nunez afirma que em todo o Brasil se constata essa presença galaica, variando sua intensidade conforme "os diferentes momentos de nossas ondas, ibéricas ou galaicas, para lá". Ressalta, porém o nordeste do Brasil, como também Minas Gerais e os Sertões, citando ainda o Rio de Janeiro bem como os demais centros urbanos, havendo nesses, uma mescla maior com ritmos e estilos contemporâneos.
O nordeste do Brasil, a área de Pernambuco, mesmo a Bahia, é a parte mais antiga. O nordeste foi a primeira região a ser colonizada e encontramos músicas peninsulares que lembram muito a música da gaita-de-foles, porque foi a gaita-de-foles, o primeiro instrumento que levaram os portugueses lá em 1500, quando chegaram à praia de Porto Seguro. Na carta do Descobrimento, redigida por Pero Vaz de Caminha, nos conta como se abaixou um gaiteiro que começou a tocar aos índios, eles gostaram, e a partir daí isso foi como uma bomba. A gaita foi o instrumento que lhes juntou-se acima das línguas. Os jesuítas escreviam cartas que diziam que não haverá um chefe índio que não deixe seus filhos para que lhes ensinarem a tocar. Encontramos gaiteiros negros em quadros, gaiteiros indígenas, com penas, algo impressionante. Depois da gaita de fole foi desaparecendo, mas sua alma ficou no imaginário da música. A alma da gaita continua a existir na alma da música popular, as melodias, os modos, as quedas...
No Sertão, que vem do deserto e é o grande deserto no interior do Brasil, salve a nossa idade média viva. Lá você encontra instrumentos que estão esculpidos no Pórtico da Glória de Santiago de Compostela, instrumentos medievais, que já não há quase na Europa, como as rabecas ou até as violas medievais, e que continuam tocando e a serem construídas no interior do Brasil. Por isso, eles têm o sonho de que no interior do Brasil é a Idade Média, é por isso que Paulo Coelho se tornou tão famoso com esse livro sobre o Caminho de Santiago, esse imaginário medieval no Brasil é fortíssimo...
Em Minas Gerais, lá se encontra uma Galiza do período Barroco. Era a febre do ouro, para onde iam os Minhotos, eram áreas repovoadas por galaicos provenientes da zona do Minho, em toda a zona de Portugal, do Porto para cima, foi a Gallaecia histórica, eles repovoaram Minas Gerais. Daí o uso da gaita, de costumes, como as fogueiras de São João, o advento e todas essas palavras mágicas galegas que estão no Brasil. Foram conduzidas pela Galiza e Portugal antigo, em Minas encontramos essa parte de festas galegas e melodias muiñeirosas, como se fossem muiñeiras mas na música brasileira. Em cada parte do Brasil encontra interações diferentes. 
Há novas áreas, como o Rio de Janeiro, as cidades burguesas, onde existe mais a interação com os negros africanos, com o século XX, as harmonías do jazz, a música de guitarra está muito misturado com a música popular do século XX. Os galegos, como meu bisavô, participaram da criação de todas essas músicas que são no fundo, a soma da polca europeia com todos os ritmos internos brasileiros, como o samba ou o caxixe, tudo isso.
Linguisticamente, Carlos Nunes, também constata essa maior proximidade do português do Brasil com o da Galiza, do que entre o de Portugal. Oque explica pela uma melhor conservação da língua no Brasil, que conservou vários arcaísmos como ainda se observa na Galiza também. Propugnando que o idioma galego, tão combalido na atualidade pelo castelhano, e ameaçado de extinção, encontra no Brasil um poderoso meio para se manter vivo.
"No Brasil descobres o poderio enorme que tem o galego. Insisto em que não sou linguista mas descobri que o brasileiro é mais semelhante ao galego que ao português, percebe-se melhor. No Brasil guardam muitas coisas do galego antigo, das cantigas de amigo, do mundo dos trovadores e poesia galego-portuguesa, que se perderam por influência do castelhano. Não viria mal fazer um pouco de esforço na escola e, do mesmo modo que aprendes a gramática galega oficial, aprender o português. Se são três ou quatro coisas! Por esse pouquinho mais de trabalho podes chegar a mais de 200 milhões de falantes. Uma vez Jordi Pujol disse-me que o problema do galego era que estava castelhanizado de mais e não o entendi, mas agora captei a mensagem deste catalão que se dava conta das possibilidades do nosso idioma."
".... galego lhe vai abrir portas no mundo, de que podes perceber-te com 200 milhões de pessoas porque, como diz Caetano Veloso, 'é uma língua superior para cantar e para a poesia'."
Descobrimos a nós mesmos, por que alí (Brasil) se guarda nosso passado, nossas antigas tradições peninsulares e, certamente, guardam o nosso futuro, porque foram misturado com muitos outros componentes, como a música afro, música indígena, etc, é como uma música do futuro, que aponta para muitas questões. A ter misturado bem, fizeram-no com sabedoria e, de alguma forma, incorpora a minha música uma espécie de glamour urbano, porque o invadiu a partir do rap no Início de Rosalía de Castro, toda a parte do swing, lundum africano, esses ritmos sensuais, essa sensibilidade das melodias adaptadas ao ritmo...é um grande mistério o Brasil, que aí estava isolado. Todo o mundo sabia da ligação linguística, o brasileiro é como um galego antigo, nos entendemos melhor brasileiros e galegos, que galegos e portugueses, porque no Brasil se mantêm toda uma série de palavras antigas do galego, da época das cantigas medievais, que chegou ao mundo moderno através de trovadores contemporâneos, como Adriana Calcanhotto, ou Caetano Veloso, são todos contemporâneos, que, de repente, se falam de "as noites de luar" "as noites das estrelas", são criadores urbanos, como trovadores que jantam sushi e moram em apartamentos.

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terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Clãs Brasilaicos - Fidalgos Guerreiros do Brasil

“Todas as aristocracias guerreiras, sempre 
foram desdenhosas da riqueza e do luxo”.


A representação política na sociedade colonial se fazia representar pela nobreza. Era uma verdadeira aristocracia, onde figuravam exclusivamente os nobres de linhagem aqui chegados ou imigrados e fixados, e seus descendentes; os ricos senhores-de-engenho; a alta burocracia civil e militar do Brasil. Nos dois primeiros séculos de colonização, esse será o regime vigente na vida colonial, o clã parental.

O clã parental, teve, e tem, reflexos e influência sobre a nossa estrutura política. O clã parental é uma organização aristocrática. É uma espécie de Ordem de Cavalaria das grandes famílias dominicais. Foi enorme a sua influência no Período Colonial.

Não se deve cair no anacronismo de confundir a estrutura de clã parental com a eleitoral que posteriormente vigerá durante o império. Era o regime parental, um verdadeiro clã consanguíneo, regido por códigos de honra que abrangia toda parentela. 
"Os acostados da Nobreza eram havidos na conta de parente educados desde a puberdade sob os olhos e direção do seu chefe, auxiliados nos primeiros passos da sua carreira, casados e dotados por ele - sua feitura, como se dizia - e, por toda vida, gloriando-se da sua casa adotiva e prontos a darem a vida pelo amo, de quem se intitulavam "criados", quer dizer: homens da sua criação. Era a mesma idéia que originara a formação do patronato romano, do clã céltico, da comitiva germânica, do patrocínio visigótico, da soberania feudal". - Costa Lobo.
Ao passo que o clã eleitoral, engloba um espectro maior de pessoas, parentes ou não que estejam vinculados a um regime de dependência para com um chefe político. 

O clã era então composto pelas famílias aparentadas, tanto as que se prendem pelos laços da consangüinidade, como pelos da afinidade. Por isto, sempre exorbita a área do domínio-tronco e se estende por vários domínios, e mesmo por municípios inteiros. Normalmente, composto pelos mesmos elementos consangüíneos e afins da família patriarcal: filhos, genros, cunhados, netos, sobrinhos, irmãos, afilhados, crias. 

No período colonial, estas famílias aparentadas eram extremamente solidárias. Todas se sentiam unidas, não só nas lutas privadas, de famílias, como nas lutas contra as autoridades públicas. O talião de sangue se exercia, indistintamente, sobre os elementos da família senhorial, como também sobre os outros elementos do clã parental - desde que fossem partícipes no agravo e se tivessem colocado ostensivamente ao lado do chefe do clã, embora não residissem com ele.

O costume da indivisibilidade do domínio assegurava a permanência dos laços de solidariedade familiar, e assim foi no passado, ainda com mais generalidade e força. Tal como no período colonial, os bens móveis, passam para o filho primogênito - como se ele fosse o próprio patriarca em pessoa: - e toda a família tem assim, na indivisibilidade tradicional dos domínios, a impressão material da sua própria unidade, da sua permanência e continuidade no espaço e no tempo.
"Possuir terras herdadas era sinal de nobreza, devendo o domínio continuar indivisível nas mãos da descendência. Mantinha-se assim o orgulho das linhagens diretas, e o respeito hierático, levado pela sociedade patriarcal desaparecida. Houve como que uma identificação da terra com a família, realizando-se uma espécie de culto aos antepassados, impregnado de um certo animismo fetichista, na representação das pessoas desaparecidas, pelas coisas que lhes pertenceram. Quando morria o chefe, os seus objetos passavam na ordem da importância, isto é, da idade, às gerações dos filhos e dos netos. O gibão de couro era destinado sempre ao filho mais velho, assim como o relógio de ouro, de fabricação suíça, com sua grande corrente e pesada medalha. Vestindo o primeiro em suas campeirações semanais ou usando o segundo nas suas relações da cidade, o herdeiro se reintegrava completamente no seu papel superior do morto, dando muitas vezes a impressão de que, através destes objetos, o chefe desaparecido continuava o comando. O mesmo acontecia com os pertences da cabeça feminina do casal, que iam parar nas mãos das filhas e das netas, desde as jóias antigas, pesadonas, ofuscantes, até as almofadas de bilros para fazer rendas. E foi a propriedade territorial, mantida apesar de irreprodutiva, o elemento mesmo de imposição do interesse moral da ordem antiga sobre a nova, alimentando nas famílias já urbanizadas o orgulho do seu passado rural e aristocrático. Este orgulho, no entanto, está muito longe de ser compreendido como uma arrogância -- e deve ser entendido como uma satisfação quase ingênua de pertencer às linhagens históricas da região"
O clã patriarcal, desenvolvendo a sua função povoadora, se expandia em grupo, localizando-se e fixando-se pelo critério da contigüidade. Ora, este critério de circunvizinhança constituía-se logicamente em condição ideal, dentro da qual o in-breeding iria surgir, consolidando os laços de parentesco: e gerando o clã parental. Daí, desta tendência ao casamento entre parentes, principalmente entre tios e sobrinhas e entre primos e primas - tornarem-se as famílias mais importantes de uma localidade ou de um município, todas elas ligadas pelo vínculo da consangüinidade: e isto era uma razão de consolidação do prestígio social e material da família no período colonial e, no período do Império e ainda hoje, do seu prestígio eleitoral e político. Muito generalizado no Norte, e ainda aí dominante, esta tradição endogâmica o foi também, no período colonial, ao sul.

Tome-se como exemplo Brito Peixoto, que se fixou nas terras do Rio Grande, não só com sua família; mas com todo seu clã de parentes consangüíneos e afins: Barbosa, Lemes, Prados, Raposo Góis, Pacheco, Pinto Bandeira, Silveira, Rodrigues, etc.... todos clãs familiares que se bifurcam. 

Esse entrelaçamento das famílias senhoriais encontrava uma nova força genética no sistema de endogamia. Esta endogamia - que conservamos desde os primeiros séculos, na nossa aristocracia rural - é uma conseqüência deste método de instalação em contigüidade das novas gerações, adotado pelos pater familias senhoriais. Conseqüência do isolamento geográfico, e de uma população ainda rarefeita. 

Em São Paulo, por exemplo, um ouvidor-geral, André da Costa, testemunha que os moradores daquela região "estavam muito aparentados uns com os outros, assim por consangüinidade como por afinidade". Segundo estimativas, baseadas em estudos genealógicos, orbitava em 23,3% na época seiscentista e 42,8% na época setecentista. Uma consangüinidade, incomparavelmente, maior do que o observado em populações européias: França 2%; Inglaterra 3%; Dinamarca 4%; Saxônia 4%; Noruega 6,56%. 

Esse aspecto endogâmico, ilustra que a miscigenação, ao contrário do que se propala, não foi algo generalizado.... mas que se processou de uma forma centrípeta, em que o núcleo endógeno se conservava puro, enquanto a miscigenação se processava fora desse núcleo. 

Daí a nossa tradição rural de casamentos com primos entre si e de tios com sobrinhas - tradição que é a gêmula do clã parental. Tanto ao sul como ao norte, as famílias dos grandes senhores rurais acabaram formando verdadeiras colônias do mesmo sangue - e isto era a base biológica para a organização do clã familiar, para a sua consolidação nos costumes e para essas lutas de famílias, que no período colonial dominaram com os seus tumultos todo o Sul e todo o Norte - toda a nossa terra então colonizada. 

O processo de fixação a terra, seu desbravamento, sua defesa ante o gentio bravio, corsários e piratas que infestavam a costa, impelia que esses primeiros povoadores às armas. Uma Aristocracia de guerreiros e não de plutocratas, os caudilhos do sertão tinham, justamente por isto, a preferência, reservada sempre a toda e qualquer nobreza, para os cargos da governança. Inscreviam-se nos "livros de S. Majestade", exibindo os seus grandes feitos no sertão, as suas mais notáveis gestas de bandeirantes: um maior número de índios acaudilhados, ou uma cópia maior de "peças" apresadas, ou de malocas devastadas, ou de castelhanos desbaratados. O fato de serem pobres ou ricos pouco importava.

Prova disto é o requerimento de Diogo Unhates, de Santos, pedindo ao Ouvidor Pedro Cubas que lhe concedesse, em 1614, sesmaria ao sul:
"Diz Diogo de Unhates, morador na Vila de Santos, escrivão da ouvidoria da Fazenda dessa Capitania que, há perto de quarenta anos, é morador nesta Capitania, em cujo tempo tem servido a S. Majestade com muita fidelidade e verdade em tudo quanto a ela tem sido possível, e assim ao Governador e capitão da terra, ajudando-o a defendê-la dos inimigos ingleses e holandeses, que a vieram saquear e destruir, e assim também dos índios rebelados contra os moradores dela e de que, nos recontros e batalhas que com eles tivera, muitas vezes lhe deram muitas frechadas em seu corpo e uma no braço direito, de que ficou aleijado; e porque tem muitos filhos varões e seis fêmeas de legítimo matrimônio, e como quem é os havia de sustentar e amparar, e não tem terras onde fazer suas roças e mantimentos onde possa trazer seus gados e criações, pede uma data de terras e sesmarias na parte que se chama Paranaguá..."
Era assim que eles justificavam a concessão de sesmarias vastas: exibindo os gilvazes da luta, as mutilações do soldado, o corpo cortado pela espada do normando, do bretão ou do flamengo, ou atravessado pela flecha do bugre. Com isto, eles ingressavam na posse da terra - o que era a principal nobreza, ou nos cargos públicos, que também davam nobreza. De qualquer forma, era a bravura militar que dignificava então o indivíduo - e assegurava-lhe títulos à nobreza e à aristocracia.

Esta "nobreza de espada", foi a que vigeu nos primeiros tempos; esta é que aparecia inscrita "nos livros de S. Majestade"; esta é que era eleita para os cargos da governança. Não o era a "gente mecânica", não o eram os alfaiates, os ferreiros, os carpinteiros, os pintores, os pedreiros, como tais e antes de passarem pela purificação aristocratizante das armas. Como tais - como "mecânicos" - podiam ter figurado nos cargos da governança, nos postos da Câmara; mas, por motivo de força maior, ocasionalmente, transitoriamente, acéfala como se achava esta pela deserção dos eleitos ("por os eleitos terem ido ao sertão"), que eram gente nobre, porque consagrada e aristocratizada pelo valor guerreiro. O preconceito aristocrático subsistia na sociedade bandeirante, tanto subsistia, que o próprio Procurador do Povo, em certa ocasião, verbera o abuso de deixarem entrar na república "homens oficiais mecânicos e gente baixa".

Era então a nobreza paulistana, antes de tudo, uma nobreza guerreira e não de riqueza, como passou a ser nos séculos III e IV com o pastoreio, com as minas e com o café. Esses paulistas, que nas cortes portuguesas, são referidos como efeito de irritante pavor para aqueles que, então, pensavam reduzir-nos à simples condição de colônia.

Depois dessas primeiras gerações, Portugal, degradado em sanguessuga de tributos, vem completar o seu parasitismo com as funestas companhias, que, em monopólios execráveis, devem alimentar os inúteis e abjetos dirigentes de lá; quando Portugal separa as populações com as garantias feitas ao reinol insolente e ganancioso, incapaz de qualquer atividade que não seja a rapina mercantil.

Os bastardos dos Braganças, não só entregaram o monopólio comercial as Companhias, quando quase mataram a própria população portuguesa de fome e feriram de morte suas poucas manufaturas, como transformaram o Brasil em uma Colônia terceirizada da Inglaterra, formando o capital da industrialização anglo-saxônica, mas sobretudo, extinguiram o Direito aos cargos da governança serem  exercidos exclusivamente pela nobreza da terra. Oque motivou os episódios da: Revolta de Beckman, Guerra dos Mascates, dos Emboabas, todos, em reação a perda do status quo

Essa mudança institucional, foi um golpe de morte para a fidalguia brasileira, que perdeu seu poder político para os reinóis, gente sem eira nem beira, que chegava com alguns trapos, e enriqueciam da noite para o dia com os escambos que arrematavam. Concomitante a perda do poder político, e o declínio econômico, o espirito mercantil prevalece e degrada os valores. Casamentos arranjados com gente de baixa estirpe, a perda dos laços parentais. 

O desfazimento do clã, leva ao fim da contiguidade da propriedade familiar sob o poder de um chefe, e conduz a divisão sucessorial, desarticulando a estrutura da família e, em conseqüência, o fim do clã parental, que se baseavam, uma e outro, nesta continuidade e nesta unidade ideal.



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O Combate de Getúlio Vargas aos Regionalismos e as Doutrinas Estrangeiras


Clãs Brasilaicos:

Clã Aguirre
Clã dos Andrade(s)
Clã Alvares Correia (Alves)
Clã dos D'Ávilas
Clã dos Albuquerque 
Clã dos Araújos
Clã Brito Peixoto
Clã dos Bueno(s)
Clã dos Camargo(s)
Clã dos Carneiro(s)
Clã dos Cavalcanti Albuquerque(s)
Clã dos Menezes
Clã Noballas y Urreya
Clã Paes Leme
Clã Rendon de Quebedo
Clã dos Saraiva(s)
Clã Vidal de Negreiros
Clã Vieira de Mello


domingo, 23 de outubro de 2016

Nacionalidade e Nacionalismo.

"Um Estado gigante, um verdadeiro continente,
uma nação-continente!"

Pierre Deffontaines,
proeminente geográfo francês
ao se referir ao Brasil.


Ante o deturpamento generalizado do conceito de nacionalidade, devemos nos ater ao conceito de nação e por desiderato de nacionalismo.

Nação como denuncia a própria terminologia significa “nascidos de...”, oque compreende uma ascendência comum. Nem precisaríamos recorrer ao termino grego “genos”, que também remete a uma ancestralidade comum.  

Na Gália, Júlio César reporta, que todos os gauleses afirmavam descender de Dis PaterOs irlandeses guardaram essa tradição mítica e referiam à Galiza, como o berço do qual descendiam. Cria-se que Breogan era o avô-divino da teuta.

Para os celtas, mesmo os filhos adotivos, não provindos diretamente dos laços matrimoniais, eram tidos como parte da teuta(nação), por possuírem essa descendência comum.

No atual hino da Galiza, seu autor, Pondal, alude a Breogan como mítico progenitor de todos os galaicos. A "nação de Breogan", de todos aqueles com ascendencia em Breogan, e por conseguinte, galaicos, seriam todos os seus descendentes. 

De modo que, o conceito de "nação", remete a uma descendência comum de algum personagem mítico, ou sanguíneo (o genitor)". Na antiguidade a transmissão cultural: valores, crenças, línguas, etc.... estavam intrinsecamente interligados a descendência, porque assim se operava a transmissão cultural, de forma orgânica. Mesmo povos eventualmente submetidos, tendiam a se integrarem e assim eram absorvidos.

De sorte que o deturpamento ideológico atual, de “nacionalismo” no Séc. XX, é flagrante, em completo desalinho com sua concepção original. Especialmente na idéia difundida da equiparação do conceito de “nação” a um padrão racial. Oque são coisas distintas.

Por “raça” se compreende um padrão homogêneo de caracteres físicos de um agrupamento humano. Quando a antropologia passou a se debruçar com mais vigor sobre o assunto, vários estudiosos da época, já apontavam que os grupos raciais humanos, em especial os da Europa, já se encontravam amplamente misturados.

Então se levarmos em conta a “raça” como equivalente a um elemento definidor da nacionalidade, para efeito de lógica, mesmo recuando no tempo e no espaço, no início das formações nacionais da Europa. NENHUM! Nenhum país atualmente subsistiria como entidade nacional. O caso da Alemanha é sintomático, a Baviera, de raça alpina(majoritariamente, havendo outros elementos presentes), contraposta ao norte saxão. Sem levar em conta as profundas diferenças culturais de credo e língua, completamente antagônicos. De mencionar ainda o berço da “nacionalidade alemã” com a antiga Prússia, báltica, sem qualquer ligação com os germanos. Falamos da Alemanha apenas por uma questão simbólica, de sempre mencionarem-na como exemplo de um corpo nacional. Itália, França, Inglaterra, Espanha, Rússia, etc.... são casos ainda mais gritantes.

Reiteramos que a definição da nacionalidade não se liga a um padrão racial homogêneo, que é um deturpamento ideológico surgido em fins do Séc. XIX. Mas sim, a uma origem comum, consanguínea. Oque não necessariamente resulta em um padrão racial.

É bem possível, e natural, que um agrupamento humano, estabilizado, que não sofra influxos externos, venha constituir com o tempo, e de forma orgânica, um padrão racial homogêneo. Sendo isso conseqüência e não fator original de sua unidade. 

Contudo, não basta a consanguinidade. O fator decisivo para configuração de uma nacionalidade reside na sua unidade política, Assim pois, se explica as diversas tribos celtas, nunca terem constituído uma nação, pois careceram de unidade política, que lhes conferissem esse status quo.E no que pese, antes dominarem praticamente toda Europa continental, todas caíram sob julgo de outros povos, com exceção de Portugal, que se constituiu como nação, e veio a ser o único país de orígem celta com soberania. A Irlanda, só recentemente consegue ascender a soberania e mesmo assim, não conserva seu nome de orígem "Eire", tomará o nome dado por seus algozes ingleses "Ireland". Eslavos, germanos, helenos.... são todos povos que dispõe de uma orígem comum, mas se encontram pulverizados em diversas nações, isso porque reiteramos, o fator decisivo para a nacionalidade reside na unidade política. 

Alguns autores, falam da necessidade de haver consciência da nacionalidade. Somos de acordo, apenas ponderamos que essa "consciência" se materializa mediante uma unidade política. 

Finalmente aplicando esses conceitos aos brasileiros, vemos de forma muito evidente como os brasileiros constituem uma nacionalidade mais do que de quantas haja na Europa ou no resto do planeta. A primeira formação nacional das Américas! Anterior a imensa maioria das atuais formações nacionais europeias.

Todos os brasileiros, praticamente em sua esmagadora maioria, tem como ancestralidade comum aquela proto-célula luso-tupi que lhes deu a base da nacionalidade. Um Estado próprio, um território próprio, uma unidade política incomum para um país de proporção continental, que nem Rússia, nem EUA, nem tampouco Canadá detém. 

Este Estado do Brasil que desde o Séc. XVI é visto como unidade política, com armas e brasões próprios. Mesmo a política mesquinha da Metrópole quando tenta bipartir o Brasil em dois, o Estado do Maranhão, todo aquele norte, com o Brasil ao sul, não passam de atos infecundos, porque a unidade do Brasil já estava feita e a vida nacional segue normalmente. 

As levas de imigrantes despejadas no Brasil, ao contrário do que sucedeu nos EUA, Argentina e Uruguai, nunca suplantaram a população original, a ponto de se dizer na Argentina, que os seus descendentes dos heróis de 17, foram substituídos por gente outra estranha a sua história. No Brasil não, o contingente imigratório sempre foi ínfimo ao da população original. De se assinalar, que mesmo esse baixo contingente, logo em sua primeira geração se liga aos nacionais. No caso da imigração italiana, a segunda mais numerosa, 70% de italianos imigrados, em sua primeira geração, casam-se com brasileiras e 40% das italianas com brasileiros.  

A ressaltar que o maior corpo imigratório para o Brasil, de longe, foi o português, vindo depois italianos e em terceiros "espanhóis" sendo 80% desses galegos, daí a imigração espanhola ter passado tão desapercebida. Contingentes alemães, japoneses tão insistentemente repetidos pela boca de alguns, foram agrupamentos insignificantes. Basta comparar os números dos 3 maiores grupos imigrantes no Brasil (portugueses, italianos e espanhóis) aos dos EUA (15 milhões), para mensurar o quão ínfimo foram os corpos imigratórios para o Brasil. Mesmo somente a imigração italiana para a Argentina (três milhões) foi muitíssimo maior do que a ocorrida no Brasil. Ainda, a guisa de comparação, a imigração espanhola na Argentina foi de 1.38 milhões, contra 700 mil no Brasil (3ª maior). Contabilizando outros contingentes imigratórios, a Argentina totalizou 7 milhões de imigrantes, contra um total de 4.1 milhões no Brasil. A considerar, ainda, que o Brasil tinha, à época, uma população maior do que a Argentina.

Posição
Nacionalidade
Período Principal
Quantidade Estimada
1
Portugueses
1822-1960
~1,5 milhão
2
Italianos
1870-1930
~1,4 milhão
3
Espanhóis
1880-1950
~700 mil
4
Alemães
1824-1940
~200 mil
5
Japoneses
1908-1940
~190 mil
6
Franceses
1820-1930
~150 mil

Em suma, tudo isso apenas para ficar evidente que não houve impacto populacional na recente imigração para o Brasil. 

De mencionar ainda que alguém que analise a distribuição humana no Brasil, notará que determinadas faixas apresentam um maior ou menor grau de determinado biotipos humanos. A Faixa litorânea, que se estende de Pernambuco ao Vale do Paraíba em São Paulo, apresentará um maior número de biotipos mulatos, isso porque era zona canavieira, aonde se empregou mais amplamente o trabalho escravo. Oque não desnatura serem populações com mesma origem luso-tupi presentes em todo o território nacional, apenas variando em seu maior ou menor grau com outros contingentes. 

Tudo isso já foi amplamente dito e repetido por historiadores e antropólogos brasileiros e comprovado geneticamente. Sérgio Penna, geneticista, e profº da UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais, após realizar amplos estudos genéticos na população brasileira constatou que os brasileiros de diferentes regiões são geneticamente muito mais homogêneos do que se esperava. Segundo o geneticista Sérgio Pena:

“Pelos critérios de cor e raça até hoje usados no censo, tínhamos a visão do Brasil como um mosaico heterogêneo, como se o Sul e o Norte abrigassem dois povos diferentes. O estudo vem mostrar que o Brasil é um país muito mais  integrado do que pensávamos.”.


Ver também:

01. O Castilhismo como Materialização do Período dos "Cinco Bons Imperadores".
17. Uma Grécia nas Ribeiras do Atlântico Sul.