Precisamos distinguir duas formas
de capitalismo: o capitalismo individualista (liberalismo) e o capitalismo
solidarista (trabalhismo).
O capitalismo individualista é
oque tem como elemento psicológico o egoísmo. É oque pretende tudo para si. Os
métodos do individualismo são os da luta, luta pela dominação, luta pelo
sujeitamento do indivíduo a outro indivíduo, luta pelo ganho sem limites, sem
considerações, sem escrúpulos.
O pensamento do capitalismo
individualista é dirigido exclusivamente para o lucro, para a acumulação da
riqueza, que quer para seu exclusivo proveito. Por isso não titubeia em
explorar o braço do trabalhador, em sugar-lhe todas as energias, como em
explorar as necessidades do povo. Para o capitalista individualista são
estranhas quaisquer considerações de ordem ética ou social. Para obter cada vez
maiores lucros não hesita em recorrer aos processos mais condenáveis, desde o
mercado negro até a formação de trustes. Sua filosofia é que , na luta pela
vida, os fracos e indefesos devem sucumbir à ação dos mais fortes. Não tem
consideração pelos semelhantes. O seu objetivo é um só: ganhar dinheiro e mais
dinheiro, amontoar fortunas para seu exclusivo benefício, para satisfação do
seu egoísmo e, muitas vezes, para malbaratá-las no luxo e na dissipação. As
misérias, as privações e os sofrimentos alheios são meras contingências da
natureza, uma espécie de lei inexorável da vida, à qual os oprimidos devem
resignar.
O capitalismo individualista
(liberalismo) propende, em suas últimas consequências, para o monopólio, para a
hegemonia econômica, para a exploração do povo, para o imperialismo.
É, senhores, esse tipo de
capitalismo, egoísta e agressivo, que nós combatemos, porque ele gera a
opressão, a miséria, as guerras, a desgraça das nações.
Mas, ao lado dessa forma de
capitalismo inexorável e sem entranhas (capitalismo individualista / liberal),
pode haver outro capitalismo (capitalismo solidarista / trabalhista) qe não
mergulha sãs raízes no egoísmo, mas inspira nos princípios da cooperação e da
solidariedade social.
Parte da ideia de que toda forma
de produção visa satisfazer necessidades humanas e que deve, em consequência,
existir um nexo de solidariedade entre essas necessidades, os que detem ou
coordenam os meios de produção e os trabalhadores que acionam esses meios. Entende,
por isso que se deve instituir um sistema de cooperação social em que
adjudicando embora aos coordenadores dos meios de produção ou capitalistas a
parte que lhes é devida na produção da riqueza, se atenda, por outro lado, à
contribuição prestada pelos trabalhadores e aos interesses gerais da
coletividade.
Preconiza esse sistema que as
relações entre o capital e o trabalho sejam reguladas por uma legislação justa
que tenha na devida conta o esforço e a cooperação do trabalhador na produção
dos bens que formam a riqueza nacional. Considera o organismo social como um
todo solidário que só poderá manter em posição estável como o aplainamento das
desigualdades sociais, não devendo, por isso, a riqueza acumular-se apenas em
alguns pontos para não comprometer o equilíbrio de todo o sistema.
A essa forma de capitalismo humanizado, que não desconhece
os princípios da solidariedade social, mas antes nele se assenta, damos o nome
de “capitalismo solidarista”.
Sua concepção fundamental é que o capital não deve ser apenas um
instrumento produtor de lucro, mas principalmente, um meio de expansão econômica
e de bem-estar coletivo.
Esta é também, senhores, a ideia substancial
do nosso programa. Para nós, trabalhismo e capitalismo solidarista são
expressões equivalentes.
Trabalhismo e capitalismo
solidarista são expressões equivalentes, por que, no seu conceito, se ressalta
o primado do trabalho na produção da riqueza. “A fonte fecunda de todos os bens
exteriores, proclama a Encíclica ‘Rerum Novarum’, é principalmente o trabalho
operário, o trabalho dos campos e da oficina. Tal é a fecundidade e a
eficiência do trabalho que se pode afirmar, sem receio de engano, que é ela a
fonte única de onde procede a riqueza das nações. Por isso, manda a equidade qe
o Estado se preocupe com os trabalhadores à sociedade, lhes seja dada uma parte
razoável, como habitação e vestuário, para que possam viver à custa de menos
trabalho e privações. Essa solicitude, continua Leão XIII, longe de prejudicar
alguém, tornar-se-á, ao contrário, em proveito de todos, porque importa
soberanamente a nação que criaturas humanas, que são para ela o princípio de
bens tão indispensáveis, não se encontrem continuamente a braços com a miséria”.
Infelizmente a dotrina dos
pontífices, nem sempre tem sido seguida por aqueles mesmos que deveriam ser os
seus propagadores e defensores pois tem, frequentemente, a alma mais inclinada
para realidades terrenas do que para as promessas do céu. Eis porque Pio XI
deplora:
“que muitos que se dizem católicos tenham esquecido a ei sublime da
justiça e da caridade, a qual não somente prescreve dar a cada m o que lhe é
devido, mas ainda socorrer nossos irmãos como a Cristo mesmo. E acoisa mais
grave, por cobiça de lucros, não receiam oprimir os trabalhadores, havendo
também os que abusando da religião para vexame da própria religião, fazem do
seu nome um anteparo com o fim de subtraírem as reivindicações plenamente
justificada dos trabalhadores. Nós não deixaremos nunca, de reprovar semelhante
conduta, visto que são essas causas pelas quais a Igreja, embora não o
merecendo, pode ser acoimada de tomar a defesa dos ricos e de não ter
sentimento algum de piedade para os sofrimentos daqueles qe se acham deserdados do se quinhão de bem
estar nesta vida.”
Cito, católicos, a palavra dos
pontífices, não para afagar vossas crenças, e captar a vossa simpatia – pois não
devemos por jamais a religião a serviço da política, nem a política a serviço
da religião – mas para que conheçais a verdadeira doutrina social da Igreja e
compreendais que é engano supor que ela defende o capitalismo individualista
(liberalismo).
Nosso programa, trabalhista, é
profundamente humano e essencialmente cristão.
O mal não esta em que haja
iniciativa privada, o mal esta em que essa iniciativa seja conduzida num
sentido egoísta e individualista, em explorar o povo, ao invés de ser dirijida
para o bem coletivo.
Desejamos um capitalismo sadio,
humano, que reconheça os direitos dos trabalhadores, que compreenda sua
verdadeira função econômica e social, que se inspire nos princípios da
solidariedade, que suporte os encargos que lhe incumbem perante a coletividade.
Somente um capitalismo
cristianizado, mas que não aparenta ser cristão e crente apenas quando trata de
receber, continuando anti-cistão quando trata de dar; somente um capitalismo
que não faça da religião como dizia Pio XI:
“o anteparo de sua cobiça, e que ignore quando estão em jogo os
interesses dos trabalhadores e do povo; somente um capitalismo espiritualizado,
sentimentalizado, tal como nós o concebemos e que se identifica com o próprio
trabalhismo , - pois nesse caso, o capitalismo será um trabalhador por
excelência – somente esse capitalismo poderá, na hora atual, salvar o mundo do débâcle
e preservá-lo da escravidão.”.