sábado, 24 de maio de 2025

O Estado Positivista Catarinense como Realização do Projeto Republicano Brasileiro (1891-1924)


Com a proclamação da República, uma fecunda intelectualidade positivista-militar chegou ao poder em Santa Catarina — e, mais do que em qualquer outro estado do Brasil, conseguiu implementar o projeto político-republicano pensado para o país. Isso ocorreu até mais do que no Rio Grande do Sul, para onde os holofotes — da difamação e da calúnia — costumam apontar. A Constituição de Santa Catarina foi mais influenciada e, por assim dizer, mais alinhada aos preceitos comtianos do que a do Rio Grande do Sul, sempre referendada como 'positivista' (não se nega a influência positivista, mas, no RS, se revela nuances e práticas distintas, que lhe conferem natureza própria, sui generis). O fato é que Santa Catarina, diferentemente do Rio Grande do Sul — que se viu envolto em guerras sangrentas provocadas pelos liberais (exceto nos primeiros anos da República, com a Revolução Federalista, que chegou a ocupar a então capital, Desterro [Florianópolis]) —, ingressou em um período de grande estabilidade após esses eventos, com a consolidação desse grupo político-positivista. Sob a liderança e o prestígio de Lauro Müller, que conseguiu fazer sucessivos sucessores durante todo o curso da República Velha, promovendo um período excepcional de prosperidade em Santa Catarina.


O Partido Republicano Catarinense - PRC

O Partido Republicano Catarinense foi fundado em 27 de junho 1887, por Raulino Júlio Adolfo Horn. Descendente de alemães, graduado em Farmácia na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, seguindo a profissão do seu pai. Ajudou a fundar o clube abolicionista de Desterro (Florianópolis) e trabalhou como jornalista, fundando jornais para disseminar os ideais do PRC. 

A República propíciou à difusão das ideias positivistas, especialmente entre militares, engenheiros e jovens formados nas escolas técnicas e militares do Império. E foi desse núcleo positivista que saiu o grupo formado em torno da redação do jornal "O Estado", em Desterro, que congregava intelectuais, juristas e políticos alinhados com os princípios de ordem, progresso e organização racional do Estado. Esses positivistas catarinenses tiveram papel decisivo na elaboração da Constituição Estadual de 1891, que refletia fortemente os ideais de Auguste Comte, preconizando um governo técnico, centralizador e reformista. A influência castilhista também se fez sentir, principalmente através de conexões com o Partido Republicano Rio-Grandense, inspirado por Júlio de Castilhos.

Com proclamação da República, Uma Junta Governativa administrou Santa Catarina de 17 de novembro de 1889 à 2 de dezembro de 1889. O Triunvirato, composta por João Batista do Rego Barros Cavalcanti de Albuquerque, Alexandre Marcelino Bayma e Raulino Júlio Adolfo Horn. Quando o então Presidente Marechal Deodoro da Fonseca, nomeou Lauro Severiano Müller, para Presidente (governador) de Santa Catarina, por indicação de Benjamin Constant. Assumindo em 2 de dezembro de 1889. Interinamente foi substituído pelo Vice-Governador Raulino Júlio Adolpho Horn. Que também veio a renunciar, tendo governado de 24 de agosto à 29 de setembro de 1890. Oportunidade em que entrega o governo ao então vice-governador Gustavo Richard. E segue para o Rio de Janeiro para assumir o cargo de Senador por Santa Catarina (1890-99), e Lauro Müller, o cargo de deputado constituinte (eleito em setembro de 1890).

Müller reassumiu o governo de Santa Catarina em 10 de novembro de1891, quando já se encontrava deflagrada a Guerra Federalista e foi forçado a renunciar 18 dias após. A renúncia de Deodoro em 23 de novembro e a ascensão de Floriano Peixoto, que anulou a dissolução do Congresso. Acarretou na deposição dos governadores deodoristas,em vários estados. Em Santa Catarina, a oposição lberal se voltou contra Lauro Müller na capital – então Desterro – e em vários municípios. Republicanos de Blumenau, liderados por Hercílio Luz, formaram uma coluna armada que se pôs a caminho da capital para defender o governador. Mas, sem a garantia das tropas federais, Müller ponderou que suas chances de resistência eram mínimas e renunciou ao governo em 28 de dezembro. 

Lauro Müller retomou o mandato de deputado em abril de 1892, com a reabertura do Congresso Nacional. Nessa oportunidade, estabeleceu relações com dirigentes do Partido Operário Brasileiro, organizado pelo tipógrafo Luís França e Silva. Solicitando, em maio, à Câmara que examinasse a representação do partido em favor da instituição das oito horas de trabalho. 

Em 1893, passou a prestar apoio ao governo federal. Quando Floriano Peixoto enviou tropas na luta contra os Maragatos, partidários de Silveira Martins, no Rio Grande do Sul e a Revolta da Armada. Em Santa Catarina, o governador Manuel Joaquim Machado se aproximou dos liberais (maragatos) e rompeu com o governo central, deixando o governo no mês de junho e substituído pelo vice-governador Eliseu Guilherme da Silva. Em setembro, teve início a Revolta da Armada no Rio de Janeiro. Após ser derrotado, o almirante Custódio de Mello se dirigiu com parte da esquadra rebelde para Santa Catarina, aliando-se aos liberais (maragatos). Enquanto Eliseu Guilherme da Silva passava o governo ao segundo vice-governador, Cristóvão Nunes Pires, os revoltosos ocuparam Desterro e instalaram um governo provisório da República chefiado pelo capitão de mar e guerra Frederico Guilherme de Lorena.  

No mês seguinte, Lauro Müller tomou parte na força expedicionária legalista do general Francisco de Paula Argolo, incumbida de impedir o avanço da coluna de Gumercindo Saraiva, advinda do Rio Grande do Sul, sobre Santa Catarina. Mal equipadas e inferiorizadas numericamente, as tropas legalistas evitaram o combate direto, recuando para Curitiba. Os maragatos de Gumercindo Saraiva prosseguiram a ofensiva: conquistaram a capital paranaense, o porto de Paranaguá e a cidade de Lapa (PR), marchando em direção a Itararé (SP). 

Müller retirou-se com as tropas legalistas para São Paulo e não participou das operações militares subsequentes contra os maragatos. Em março de 1894, as forças de Gumercindo deixaram o Paraná e recuaram para o Rio Grande do Sul. Em 22 de abril, o coronel Antônio Moreira César foi nomeado interventor federal em Santa Catarina, quando governou até setembro. Oportunidade em que Hercílio Luz foi empossado como primeiro governador eleito pelo voto direto. Um dos seus primeiros atos como governador foi a mudança do nome da capital estadual para Florianópolis, em homenagem a Floriano Peixoto. 

Reeleito deputado federal em outubro de 1894. Müller tornou-se a figura de maior prestígio da política catarinense no cenário nacional, ao mesmo tempo em que Hercílio Luz se consagrava como principal chefe político no estado. Na Câmara dos Deputados, integrou o grupo de parlamentares florianistas do Partido Republicano Federal - PRF que, sob a liderança do deputado paulista Francisco Glicério, tentou, sem êxito, tutelar as ações do presidente Prudente de Morais (1894-98). Reeleito deputado em 1896, renunciou à Comissão de Orçamento em junho seguinte, em solidariedade a Francisco Glicério, derrotado na eleição para a presidência da Câmara. Também em 1897, cuidou da organização do Partido Republicano Catarinense (PRC), juntamente com o governador Hercílio Luz, com quem acertou a composição dos principais diretórios municipais. De volta ao Rio de Janeiro, participou da convenção oposicionista que lançou o nome de Lauro Sodré às eleições presidenciais de março de 1898, vencidas por Campos Sales, ex-presidente do estado de São Paulo. A eleição para o governo catarinense ocorreu no mesmo ano, com a vitória do capitão Filipe Schmidt, deputado constituinte em 1891 e primo de Müller.

Ao término do seu mandato de deputado federal, Lauro Müller foi eleito senador por Santa Catarina em 1900.   Em 1901, atuou como mediador da crise no PRC entre a ala dissidente de Hercílio Luz, defensor da reconciliação com os liberais, e o grupo do governador Filipe Schmidt, contrário. Müller apoiou a ideia da reconciliação e conseguiu reunificar o partido. Proclamado chefe supremo do PRC, foi eleito governador de Santa Catarina em agosto de 1902. Empossado no mês seguinte, já em novembro passou a chefia da administração estadual ao vicegovernador Vidal Ramos, acedendo ao convite do presidente eleito Rodrigues Alves (1902-06) para integrar seu ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas. Quando foi um dos principais responsáveis pela remodelação do porto do Rio de Janeiro, obra prioritária do programa de governo do presidente Rodrigues Alves. A modernização do porto e a reforma urbana liderada pelo prefeito Francisco Pereira Passos transformariam radicalmente a fisionomia da capital da República. O plano das obras do porto do Rio de Janeiro ficou a cargo de uma comissão presidida por Müller. Também foi prevista a abertura de duas grandes vias para a comunicação do porto com a cidade: a avenida Central (depois denominada Rio Branco) e a avenida do Mangue (futura Francisco Bicalho). A construção ferroviária com Lauro Müller no Ministério da Viação, teve um acréscimo de 1.560 quilômetros, atingindo o total de 17.240 quilômetros! A Estrada de Ferro Central do Brasil (EFCB) prolongou a chamada Linha do Centro, alcançando as cidades de Cordisburgo, Curvelo e Corinto, em Minas Gerais. O alargamento da bitola da EFCB no ramal de São Paulo, obra essencial para a ligação entre as duas maiores cidades do país, foi bastante adiantado. Em outubro de 1904, Lauro Müller autorizou a Companhia Estrada de Ferro Noroeste do Brasil a promover a ligação entre Bauru (SP) e Cuiabá, levando em conta a importância estratégica da comunicação ferroviária entre a região Sudeste e o estado do Mato Grosso. Em setembro de 1906, o primeiro trecho de cem quilômetros da Companhia Noroeste foi inaugurada em cerimônia que contou a presença de Müller, do presidente do estado de São Paulo, Jorge Tibiriçá, e vários políticos paulistas. Em junho de 1905, o Ministério da Viação promoveu concorrência para a implantação da ferrovia Madeira-Mamoré, por força do Tratado de Petrópolis em novembro de 1903 que obrigara o Brasil a assumir os custos da construção da ferrovia, como forma de compensação à Bolívia pela perda do Acre. A concessão outorgada ao engenheiro Catramby foi adquirida pela Madeira-Mamoré Railway, empresa ligada à Brazil Railway, do empresário estadunidense Percival Farquhar, que levou a cabo o empreendimento.


  • 1891 – Lauro Müller (interinamente)
  • 1891–1894 – João Batista do Rego Barros Cavalcanti Albuquerque
  • 1894–1895 – Hercílio Luz (1º mandato, interrompido)
  • 1895–1898 – Lauro Müller (2º mandato efetivo)
  • 1898–1902 – Filipe Schmidt (1º mandato)
  • 1902–1904 – Alfredo d'Escragnolle Taunay (Barão de Taunay)
  • 1905–1910 – Vidal Ramos (1º mandato)
  • 1910–1914 – Vidal Ramos (2º mandato)
  • 1914–1918 – Filipe Schmidt (2º mandato)
  • 1918–1922 – Hercílio Luz (2º mandato)
  • 1922–1924 – Hercílio Luz (3º mandato; faleceu no cargo)


Raulino Júlio Adolfo Horn (1849–1927)

Filho de imigrantes alemães e natural de São Pedro de Alcântara, Raulino Horn foi farmacêutico, jornalista e político atuante. Fundador do Clube Abolicionista de Desterro e um dos primeiros republicanos catarinenses, Horn teve papel decisivo na militância pelo regime republicano desde 1887.

Foi vice-governador em diversas gestões, sobretudo ao lado de Lauro Müller, e assumiu interinamente o governo estadual várias vezes entre 1890 e 1920, sempre atuando como agente conciliador em momentos de crise. Deputado estadual em três legislaturas e presidente da Assembleia Legislativa, destacou-se por seu compromisso com a ordem institucional e a defesa da república.

Faleceu em 1927, aos 78 anos, sendo uma das vozes mais persistentes do republicanismo e do positivismo técnico em Santa Catarina.


Lauro Severiano Müller (1863–1926)

Lauro Müller, Presidente de SC
por 4 vezes. Deputado Constituinte,
Senador, Marechal do Exército,
ministro e Chanceler.
Figura central do positivismo catarinense e principal liderança política da transição do Império para a República em Santa Catarina. Natural de Itajaí, filho de imigrantes alemães, formou-se engenheiro militar em 1885 na Escola Militar da Praia Vermelha, tornando-se discípulo de Benjamin Constant, que influenciou sua adesão ao positivismo. Nomeado primeiro governador republicano de Santa Catarina em 1889 por Deodoro da Fonseca, inaugurou a administração republicana com foco em educação, infraestrutura e modernização administrativa.

Assumiu o governo estadual várias vezes: inicialmente de 1889 a 1890, depois brevemente em 1891 (renunciou por pressão da Revolução Federalista), e novamente eleito para o período de 1902 a 1906, embora tenha governado apenas 44 dias dessa vez, entregando o cargo ao vice Vidal José de Oliveira Ramos para assumir ministérios federais. Durante seu ministério da Viação (1902-1906), promoveu grandes obras, incluindo a abertura da Avenida Brasil e a ampliação da rede ferroviária, essenciais para o escoamento da produção catarinense.

Foi senador entre 1890–99 e de 1912 até sua morte. Na sessão de 22 de dezembro de 1890, da Câmara Federal foi quem primeiro apresentou na República, a previsão de mudança da capital federal para o Planalto Central. Pioneiro também na iniciativa da realização de obras contra a seca no semiário-árido brasileiro. 

Tendo sido também Ministro das Relações Exteriores, Chanceler, de 1913 à 1917, quando deixou o cargo sob pressão da opinião pública devido à Primeira Guerra Mundial e suas origens germânicas. Em 1918, foi eleito governador de Santa Catarina pela última vez, mas renunciou em favor de Hercílio Luz.

Müller teve papel fundamental na política nacional e na consolidação do positivismo técnico-científico catarinense, atuando no desenvolvimento da infraestrutura e na defesa do interesse regional no cenário federal. Morreu em 1926, sem herdeiros políticos diretos, oque motivou um enfraquecimento ideológico do seu grupo político. Seu nome batiza várias cidades, ruas e logradouros, além do município de Lauro Müller, importante para a mineração do carvão.


Hercílio Pedro da Luz (1860–1924)

Natural de Desterro (hoje Florianópolis), engenheiro formado pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, Hercílio Luz foi aliado próximo de Lauro Müller e um dos pilares da república catarinense. Durante a Revolução Federalista (1893–95), liderou as forças legalistas em defesa do governo estadual contra os maragatos (liberais).

Governou Santa Catarina em dois mandatos principais (1894–98 e 1918–22), além de exercer a chefia do Executivo interinamente em outras ocasiões. Seu governo destacou-se pela forte ênfase em obras públicas: expansão da malha ferroviária, construção de portos, fomento à colonização do interior e avanço da educação técnica. Sob seu comando, consolidou-se a industrialização incipiente do Vale do Itajaí, especialmente no setor têxtil.

Seu período no governo foi marcado por estabilidade política e desenvolvimento econômico, sustentando a hegemonia do grupo positivista. Faleceu em exercício do terceiro mandato em 1924, deixando um legado de modernização e infraestrutura para o Estado.


Filipe Schmidt (1850–1924)

Advogado formado e natural de São José, Filipe Schmidt foi jornalista e político de destaque no grupo positivista catarinense, aliado de Lauro Müller e Hercílio Luz. Governou Santa Catarina em dois mandatos (1898–02 e 1914–18), período em que consolidou a educação pública republicana e incentivou a colonização e o desenvolvimento industrial, especialmente no setor têxtil.

Sua gestão foi marcada por um perfil técnico, conciliador e moderado, que buscava equilibrar os interesses das oligarquias locais com as demandas modernizadoras da elite republicana. Schmidt foi essencial para estabilizar o regime e promover políticas públicas progressistas, mantendo o apoio político do grupo positivista.

Faleceu em 1924, encerrando, junto com Hercílio Luz, a era dos estadistas técnicos do positivismo em Santa Catarina.


Vidal José de Oliveira Ramos (1866–1954)

Nascido em Lages, Vidal Ramos foi político, jurista e figura importante do republicanismo catarinense, com forte ligação à linha técnica e reformista do positivismo, embora menos ortodoxo que Müller.

Governou Santa Catarina por dois mandatos (1905–06 e 1910–14), assumindo interinamente em outras ocasiões. Durante seus governos, consolidou escolas normais, reorganizou o sistema judiciário estadual, promoveu reformas fiscais e incentivou a construção de ferrovias e pontes. Foi o pioneiro no lançamento das bases da colonização do oeste catarinense, fator decisivo para a posterior expansão agrícola e econômica da região.

Além disso, teve carreira no Legislativo e no Supremo Tribunal Federal. Morreu em 1954, aos 87 anos, sendo o último grande nome do republicanismo tradicional catarinense e a transição para a modernidade institucional.


Industrialização e Modernização Econômica

Sob a égide do Estado positivista, Santa Catarina buscou integrar-se ao modelo de desenvolvimento nacional via industrialização incipiente. Diversas medidas foram implementadas no sentido de fomentar o setor manufatureiro, em especial nas regiões já dinamizadas pela presença de imigrantes alemães e italianos, como o Vale do Itajaí.

A Cia. Hering, fundada em Blumenau em 1880, e ainda hoje ativa, é exemplo vivo de empresa cuja expansão foi catalisada pelas políticas de estímulo ao desenvolvimento regional, com apoio à infraestrutura, à construção de ferrovias e à formação de um mercado consumidor interno. Junto a ela, empresas como a Karsten (1882), a Bunge Alimentos (inicialmente como Moinho Joinville, 1905) e a Tupy (fundada em 1938, mas em um solo fértil economicamente pela base lançada pelos governos anteriores) tornaram-se pilares de um modelo catarinense de indústria associada à organização familiar e ao trabalho disciplinado — valores próprios da cultura germânica incorporada às estruturas do Estado.

A indústria catarinense não foi monopolizada por grandes conglomerados, mas estruturada a partir de indústrias familiares e média propriedade rural articulada com a manufatura. Este modelo assentou as bases de um capitalismo regional de feições singulares, profundamente vinculado à cultura do trabalho e à autogestão comunitária estimados pelo Estado Positivista Catarinense.


Colonização e a Imigração como Vetores de Desenvolvimento

Outra característica estrutural do Estado positivista catarinense foi sua política de colonização e imigração, especialmente voltada para o interior e oeste do território. Por meio da ação do governo, terras devolutas foram demarcadas e organizadas para receber imigrantes europeus, principalmente italianos e alemães.

A colonização não foi apenas uma resposta à necessidade de povoamento, mas um projeto civilizatório, como parte do projeto republicano para todo o Brasil: formar pequenas comunidades disciplinadas, organizadas em torno do trabalho agrícola e do associativismo. O Estado ofereceu apoio institucional para essa expansão, promovendo a regularização fundiária, assistência técnica e serviços públicos básicos.

A colonização no oeste catarinense ocorreu por intermédio das companhias colonizadoras, em estreita colaboração com o governo estadual que almejava uma ocupação territorial concomitante ao desenvolvimento de uma atividade econômica. Essas companhias eram formadas, em sua grande maioria, por comerciantes e especuladores — “os empresários da  colonização” — que loteavam e comercializavam suas áreas individualmente, enquanto o governo estadual abriam estradas e realizava obras de infraestrutura.

Este movimento impulsionou o desenvolvimento da policultura, adaptada às condições geográficas da região e à tradição agrária dos colonos, e deu origem ao modelo fundiário de pequenas e médias propriedades, base econômica e social do mercado interno catarinense.


Hercílio Luz e a Consolidação da República Catarinense

Após a Revolução Federalista (1893–1895), que buscou deter o avanço da centralização republicana, Hercílio Luz emergiu como líder da pacificação institucional. Membro do antigo Partido Conservador, tornou-se republicano e assumiu o governo estadual, onde deu continuidade à política de modernização e estruturação estatal.

Seu mandato foi marcado por obras de vulto — como a idealização da ponte que hoje leva seu nome — e pela continuidade do projeto de colonização e desenvolvimento econômico. Sob sua liderança, consolidou-se o modelo de Estado técnico-burocrático, em que o mérito, a disciplina administrativa e a ordem eram os pilares da administração.


A Marcha  para o Oeste:

No campo da imigração e da colonização, o projeto positivista de organização da sociedade manifestou-se de forma clara. O Estado incentivou a vinda de imigrantes europeus, especialmente alemães, que já vinham se estabelecendo em Santa Catarina desde meados do século XIX. Com apoio governamental, diversas colônias foram fundadas, como Blumenau (1850), Joinville (1851), Brusque (1860) e Itajaí, ampliando-se no período republicano para o Alto Vale do Itajaí, o Planalto Serrano e o Oeste. A presença alemã em Santa Catarina chegou a somar mais de 150 mil imigrantes diretos e seus descendentes ao final do século XIX, consolidando um cinturão germânico no território estadual. Essas colônias foram organizadas com base em núcleos urbanos planejados, com pequenas propriedades agrícolas ao redor, seguindo modelo racional e produtivista caro aos positivistas. A instrução pública foi fortemente estimulada nesses núcleos, com escolas bilíngues e incentivo à formação técnica e moralista.

Com a expansão da ocupação do interior do estado, especialmente nas regiões do planalto e do oeste, o governo estadual impulsionou um ambicioso projeto de colonização e infraestrutura, articulado ao avanço ferroviário. A Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande, passando por Mafra, Lages e chegando até o Rio Grande do Sul, foi fundamental para a fixação de colonos em áreas remotas, bem como para o escoamento da produção agrícola e madeireira. Outro ramal estratégico foi o que ligava o interior ao porto de Tubarão, consolidando uma via de exportação para os produtos do planalto e da serra catarinense. O apoio governamental à construção dessas linhas férreas evidenciava o ideário positivista de progresso via ciência e técnica. Essas ferrovias não só facilitaram o acesso a terras antes isoladas, como permitiram uma colonização sistemática, baseada em lotes planejados, cooperativas agrícolas, incentivos fiscais e escolas técnicas.

O Estado catarinense, sob gestão de políticos com formação técnica e influenciados pela doutrina positivista, desenvolveu políticas de infraestrutura voltadas para a modernização econômica e social. Implantaram-se redes de telégrafo, estradas vicinais e pontes metálicas em regiões colonizadas, conectando os núcleos imigrantes entre si e com os centros urbanos. O Departamento de Terras e Colonização do Estado, criado ainda no final do século XIX, foi o responsável pela gestão dos lotes, pela regularização fundiária e pelo direcionamento dos imigrantes para áreas estratégicas, atuando em estreita colaboração com empresas colonizadoras privadas.

O Positivismo Catarinense materializou-se na constituição estadual, na política de colonização ordenada, na expansão ferroviária, na aposta em uma sociedade disciplinada, instruída e economicamente produtiva. A presença dos imigrantes alemães e a racionalidade com que se planejaram seus assentamentos refletem de forma clara os ideais de organização e progresso que marcaram a transição catarinense para a modernidade republicana.


O Modelo Republicano de Estado e Sociedade

O que se constituiu em Santa Catarina entre 1889 e 1930 não foi apenas a adaptação à forma republicana, mas a edificação de um modelo regional de Estado, com forte base racionalizadora, na política de imigração dirigida, no fomento à pequena propriedade e na industrialização descentralizada.

A formação de mini-fúndios, a predominância da policultura e a existência de um mercado interno ativo e autônomo foram produtos diretos das políticas promovidas por este Estado técnico-científico, organizado por engenheiros, e administradores positivistas. No Rio Grande do Sul, esse modelo foi implantado apenas parcialmente, ficando ausente na “campanha gaúcha”, justamente a área de reduto dos liberais-latifundiários, que tanto se opuseram ao modelo Castilhista. Tendo o Rio Grande do Sul Castilhista, funcionado como um guarda-chuva que protegeu Santa Catarina dos tumultos e ações criminosas dessas hordas.

Quando da Revolução de 30, no que pese o presidente (governador) do Estado ter declarado fidelidade ao Presidente Washington Luís, houve ampla adesão política e militar local pela Revolução, forçando o governador a renunciar. A adesão de Santa Catarina foi chave para o corpo das tropas riograndenses, sem o qual não teriam passado para além da Serra Geral. Esse apoio em muito se deveu ao estreito alinhamento histórico entre o PRC e o PRR, que em várias ocasiões apoiou com reforços militares os governos castilhistas no Rio Grande do Sul. 

Esse legado permanece visível no presente: Santa Catarina mantém uma das mais equilibradas distribuições fundiárias do país, uma economia robusta com base em pequenas e médias empresas, e índices elevados de desenvolvimento humano — frutos, em larga medida, do projeto civilizatório positivista, e que mais do que em qualquer outro canto do Brasil, mais prosperou e rendeu frutos em Santa Catarina, posto em prática por homens com obstinada fé na ordem, no progresso e na razão.




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