“O Brasil não é uma reprodução de Portugal, nem
deve pretender sê-lo, mas é uma derivação dele”.
A identidade nacional, é um tema recorrente em países “novos”
tal como os países americanos, do sul ao norte: EUA, Canadá, Brasil, Argentina,
Uruguai, México.... todos eles apresentam essa questão. No Brasil, como em
outros países ibero-americanos, o tema, sem razão, é mais problematizado do que
se deveria ante uma clara política imperialista de des-nacionalização, de
negação da nacionalidade e seu fracionamento.
Já tratamos em artigo anterior “Nacionalismo e Nacionalidade”,
sobre o conceito de nacionalidade. Em suma, a nacionalidade envolve a concepção
de uma origem comum, consciência e unidade política. Que faz do Brasil, a
formação nacional mais antiga das Américas. Porém a questão da identidade
nacional envolve outros aspectos, que envolvem seus elementos caracterizadores: língua, credo, estrutura social e política, arquitetura,
organização urbana, etc... . Algo até óbvio na formação brasileira, porém,
problematizada, como já dissemos, por razões imperialistas. O Brasil é uma
nação derivada diretamente da civilização lusitana adaptada aos trópicos. No
caso do Brasil, mais especificamente “galaica”, em referência a população
nortenha de Portugal, ante sua numerosa e majoritária preponderância no
povoamento do Brasil ao longo da nossa colonização.
Na antiguidade, no período pré-romano, os termos “lusitanos”
e “galaicos” eram equivalentes, não havia distinção. Com a criação da província
da Lusitânia ao sul e a criação da Gallaecia ao norte, a nomenclatura, passou
a designar, com o tempo, os do norte como “galaicos” e os do sul como “lusitanos”,
embora tratem-se de uma mesma população. Porém por uma maior influência romana
ao sul, na Lusitânia, e que se fez menos presente no norte, a Gallaecia conservou melhor seu substrato céltico originário.
Assim, adotamos o termo “brasilaico” para melhor designar
essa influencia nortenha na formação brasileira. Termo antes já empregado por
cronistas e historiadores da época quinhentista. O sufixo –aico é um fóssil lingüístico, remanescente da antiga e esquecida
língua lusitana, anterior a invasão romana, que remete a uma coletividade de
indivíduos.
Isso posto, passaremos a tratar sobre o povoamento do Brasil,
e seus desdobramentos caracterizadores da identidade brasileira.
O Elemento Nortenho no Povoamento do Brasil.
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Província de Entre Douro e Minho
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“A gente desta terra he
toda alva; os homês mui bem dispostos, e as molheres mui fermosas, que nam ham
nenhúa inveja às da Rua Nova de Lixboa”. Assim retrata Pero Lopes de Sousa
a população quinhentista de Salvador. A surpresa de Pero Lopes de Sousa, se explica pela relação entre normandos e tupis,
que antecederam, em 30 anos, a colonização portuguesa no Brasil e que se
prolongará ao longo de todo o primeiro século de formação na guerra de expulsão
dos franceses. Assim, é que os primeiros colonos portugueses a virem para o
Brasil, se ligarão a essas mulheres fruto dessas relações normando-tupis, bem
como na relação direta entre portugueses e tupis. Capistrano de Abreu, tratando
da guerra contra os franceses do Rio Grande do Norte a Itamaracá reporta que:
“Muitos franceses mestiçaram com as mulheres indígenas,
muitos filhos de cunhãs se encontravam já de cabelo louro: ainda hoje resta um
vestígio da ascendência e da persistência dos antigos rivais dos portugueses na
cabeleira de gente encontrada naquela e nos vizinhos sertões de Paraíba e
Ceará”.
Os dados genéticos corroboram as fontes históricas. Análises
genéticas colhidas na população, no nordeste do Brasil, revelam que 19% dos
genes oriundos da linhagem paterna são genes nórdicos. É um percentual maior do
que o observado na população portuguesa, 13%. Esse percentual por vezes é atribuído
a presença holandesa, é um equivoco, pois tanto a presença normanda foi maior,
ao longo de todo século XVI, como a relação entre indígenas e normandos foi
muito mais intensa. Os holandeses, além de tardios, ficaram reclusos nos fortes
do Recife, “d´onde nunca se apartaram
mais do que 12 léguas” e ainda permaneceram brevíssimo tempo até serem
expulsos.
Os primeiros colonos portugueses que aportam no Brasil, são
gente ligada em torno dos donatários, advindos da baixa aristocracia rural do
norte de Portugal, no dizer da época: “gente de nome e brasão”. Como relata,
por exemplo, Frei Vicente a colonização de Santos e São Vicente:
“Na ilha de dentro há duas povoações, uma chamada de Santos,
outra de São Vicente como o rio, a qual veio edificar Martim Afonso de Souza em
pessoa, e a povoou de mui nobre gente, que consigo trouxe, e assim floresceu em
mui breve tempo.”
Em Pernambuco, Duarte Coelho trouxe consigo colonos de Viana
do Castelo, a tal ponto numerosos que ao se insugirem contra emissários de
Lisboa diziam: “aqui não Del Rey mas, de
Viana!”.
Na capitania de Porto Seguro, seu donatário Campo Tourinho em
menos de 3 anos construiu 7 vilas onde distribuiu alguns colonos que o
acompanhavam a maior parte provinha de família de pescadores de Viana do
Castelo. Após a morte de Pero
Tourinho a capitania entrou em decadência, embora a Vila de Porto Seguro tenha
se mantido habitada, assim como os outros povoados fundado por Pero de Campo
Tourinho entre eles Santa Cruz, Santo Amaro e Comagi.
Nas demais capitanias em que seus respectivos donatários
vieram a tomar posse, o processo é o mesmo. Do Minho afluem as matrizes que
virão colonizar o Brasil. A guisa de parâmetro, dos portugueses processados
pela Inquisição em Pernambuco e na Bahia metade eram originários do Minho,
cabendo um longínquo segundo lugar, 15%, aos de Lisboa.
Dados de São Paulo, em 1801, revelam que 45% dos homens
portugueses provinham do Minho, 20% dos Açores e 16% de Lisboa.
A historiadora Júnia Furtado, analisando a origem dos
comerciantes portugueses radicados em Minas Gerais no século XVIII, constatou
que 74,4% eram oriundos do Norte português. Em Vila Rica, Iraci del Nero, ao
levantar dados sobre a população portuguesa radicada, constatou que 68,1%
provinha do Norte de Portugal. Entre o período de 1750 e 1779, ainda em Minas, Carla
Almeida desvela que 89% dos homens portugueses eram naturais das províncias do
norte e 11% provenientes da região central do país e nenhum do sul. Além dos
nortenhos, um fluxo notável de colonos provinham das ilhas atlânticas da
Madeira e dos Açores.
No Ceará, estima-se que entre 1750 a 1850, mais de 55% dos portugueses que se estabeleceram na província, eram provenientes do Norte de Portugal.
Essa predominância de nortenhos se explica, além do norte português ser a região mais densamente povoada de Portugal, ainda na
atualidade, mas sobretudo pela estrutura familiar minhota, em que somente os
primogênitos herdavam terras. Assim os demais filhos, deserdados, preferiam
imigrar para o Brasil e se fazerem senhores de terra, “Dominus Brasilia”, e nisso acabavam reproduzindo seu sistema feudal adaptado aos
trópicos.
Foi sob esse influxo que se gerou a “nobreza da terra”, sob a
qual se estruturou a sociedade colonial que aqui se firmava. É essa nobreza, brasilaica, que levará a cabo a conquista a terra, ganhar e
absorver o gentio, iniciar as culturas, fazer as povoações, resistir ao
estrangeiro. Trabalharem como obreiros e combatentes, edificavam
lutando. Toda a primeira formação foi assim: na boa luta, a que enraíza na
terra, e fortifica o patriotismo, porque é dessa nobreza, que advém a consciência
de existência nacional e que incita a resistência ao invasor.
“Nos primeiros colonizadores
do Brasil encontravam-se as virtudes essenciais do pioneiro português: —
solidariedade na compreensão nítida de existência nacional, hábito de atividade
disciplinada e, com isto, o sentimento de trazerem consigo uma pátria, no intuito
explícito de fazerem um novo país, pelo desenvolvimento das tradições nacionais.”
– Manoel Bomfim.
Mais de um século e meio depois, no início do século XX, a
imigração portuguesa para o Brasil continuará predominantemente oriunda do
Norte português e adjacências, nomeadamente: Trás-os-Montes, Minho, Douro
Litoral, Beira Alta, Beira Litoral e Estremadura, com oscilações de
predominância entre estas regiões ao longo do tempo.
A imigração estrangeira
para o Brasil e seu impacto na nacionalidade.
A imigração estrangeira, tende a ser superdimensionada. A imigração portuguesa, no que pese ter sido a maior, estranhamente é relegada ao esquecimento, apenas se falando marginalmente. Ao passo que outras, infimamente minoritárias, são postos a relevo para fazer crer numa suposta heterogeneidade.
Após a independência em 1822, os portugueses que afluem para
o Brasil passam a serem computados como estrangeiros e a eles se somarão
contigentes imigratórios de outras nacionalidades. Contudo, os portugueses serão o maior corpo imigratório no Brasil. E não ocorrerá aqui oque
sucedeu em outros países, como: EUA, Canadá, Argentina e Uruguai, em que suas
populações originais foram suplantadas por essa massa de imigrantes. A ponto de
se dizer na Argentina, que os descendentes dos seus heróis de dezessete, foram substituídos.
Darcy Ribeiro chamou a esse fenômeno de “povos transplantados”. No Brasil isso
não ocorreu, em nenhuma região do Brasil, mesmo ao sul.
O sul do Brasil, foi colonizado por paulistas do planalto de Piratininga.
Posteriormente em 1748 sobreveio a imigração açoriana, inicialmente em Santa
Catarina e posteriormente no Rio Grande do Sul, feita por casais, oque regra
geral dissociou do restante do país, feito majoritariamente por homens
solteiros que se ligavam as mulheres da terra. Foi esse fator que deu a essa
população meridional brasileira um aspecto mais branca do que no resto do país,
isso já observado pelos cronistas da época e que hodiernamente, é falsamente atribuído
a imigração estrangeira operada no Séc. XX. Em 1780, 55% da população do Rio Grande do Sul, eram
açorianos. Também de se assinalar que, embora os dados disponíveis não sejam
tão precisos, mas um levantamento quanto a origem dos povoadores iniciais nas
ilhas dos Açores, revelam que a maioria eram oriundos do norte de Portugal.
De modo que, ainda que levemos em conta a imigração
portuguesa, juntamente com outros contingentes, esse número não chega a
suplantar a população original. E ainda em comparação com outros países essas
cifras verificadas no Brasil são bem menores. A guisa de comparação, a
imigração italiana, foi a segunda mais numerosa no Brasil contabilizando 1
milhão e 500 mil. Somente na Argentina, que a época apresentava uma população
menor do que a do Brasil, adentraram 3 milhões! O dobro! E se compararmos a
operada nos EUA, ai vemos a insignificância, 15 milhões!!!!
Outro aspecto que costuma passar batido, é que o terceiro
maior contingente imigratório para o Brasil, foi a espanhola, contabilizando
750 mil indivíduos. E o aspecto a se ressaltar é que 80% desses “espanhóis”
eram galegos, a mesma cepa nacional portuguesa. Daí terem passado tão
desapercebidos, ainda que sendo o terceiro maior contingente imigratório, posto
falarem galaico-português , e assim se integrarem a sociedade brasileira
rapidamente.
A imigração alemã, por vezes tão propalada por alguns, foi
bem menor do que as três primeiras, orbitando em torno de 200 mil imigrantes. Note.... três vezes menor do que a espanhola. E no que pese, ter sido um contingente com
maior dificuldade de assimilação, posto o isolamento geográfico das colônias e
principalmente por causa da língua, de assinalar que a imensa maioria dos
colonos alemães eram católicos, logo na primeira geração ocorre um processo de
assimilação. Como parâmetro estatístico temos dados do censo do Rio Grande do
Sul de 1918, que revelam que 74% de homens alemães se casaram com brasileiras,
ao passo que 26% com alemãs. Note que esse processo de assimilação ocorre muito
cedo. Não havendo razões que justifiquem falar, mesmo na época e muito menos na
atualidade, passado mais de três gerações, em uma suposta "identidade alemã".
Os japoneses formam o 5º maior grupo imigratório, e
juntamente com os alemães são os que mais tiveram dificuldade de integração, em
virtude da língua, credo, de terem vindo em boa parte em casais, oque por esse
isolamento, acabavam privilegiando casamentos entre si. Porém, pela pouca
quantidade, e com o tempo acabam se integrando sem maiores sobressaltos.
Há ainda um contingente sírio-libanes, dito: turcos, por
estarem na época sob controle do império otomano (Turquia). Também de pequeno
vulto, operada quase em sua totalidade por homens solteiros e ao contrário do
que vulgo se pensa, em sua maior parte cristãos, adeptos da igreja ortodoxa sírio-libanesa (ramo
católico porem de administração independente), os de credo mulçumano são
poucos.
Disso ainda se deve ponderar, que ao se falar de imigração “italiana”,
“alemã”, e mesmo sírio-libanesa, não estamos falando de uma mesma
nacionalidade. Itália e Alemanha são países de nacionalidade artificiais que
abrigam povos distintos, com diferentes dialetos. Um Veneziano não se
identifica com um romano nem muito menos com um siciliano. Os três falam dialetos
diferentes e são de origens diversas. Então é ridículo falar em uma identidade “italiana”
simplesmente porque não existe tal identidade. O caso dos imigrantes alemães é
similar, mesmo dentro da Alemanha, há diversos dialetos, e eles se acentuam
conforme se vá ao norte ou para o sul, sendo o sul majoritariamente católico ao
passo que o norte é majoritariamente protestante, e sendo racialmente também
distintos: o norte saxão e o sul alpino. E a considerar ainda que na imigração
alemã, computa-se como tal austríacos e suíços, bem como um ramo mais
concentrado no Espírito Santo chamado pomeranos, que são bálticos e não germânicos.
Então, como falar de uma identidade alemã? Não parece razoável.
De todo esse apanhado oque se depreende é que o contingente
português por si só foi majoritário, e tanto mais antigo, a ele se soma a
imigração galega que compartilha a mesma origem nacional. Assim se somarmos
ambas, temos 2 milhões e 200 mil oque é um contingente superior a soma de todos
as outras correntes. E repita-se..... ainda juntando todas, não
suplanta a população brasileira original, ao contrário, fica bem aquém, sem maiores impactos.
A política imigratória
Getulista:
Na Era Vargas, houve uma restrição na imigração. Foi limitada a entrada de estrangeiros de todas
as nacionalidades no Brasil com a Lei de Cotas de Imigração, exceto para os
portugueses em 38. A isso se deve uma maior racionalização na política imigratória, pois tanto o Brasil já não precisava de mão de obra, pois os nacionais já supriam a demanda, como tratava de excluir contingentes com dificuldades de integração e assim "garantir o fortalecimento étnico da nação" através do elemento português. Getúlio fora bem influenciado por Oliveira Viana, Gustavo Barroso e Roquette Pinto, seu ministro, que envergavam essas idéias.
Após a II Guerra, o antropólogo Gilberto Freyre e um grupo de
deputados defenderam que os portugueses não deveriam ser considerados
estrangeiros no Brasil. Ainda hoje, os portugueses têm tratamento especial dado
pela legislação brasileira. Este dispositivo que dar privilégios a uma
nacionalidade estrangeira é raro no mundo. Por exemplo, na legislação da
Argentina não existe nenhum dispositivo que dê tratamento diferenciado aos
espanhóis, tão pouco a lei dos Estados Unidos beneficia os britânicos. Na
América do Sul, apenas na Venezuela há algo semelhante.
Após a II Guerra Mundial, os portugueses foram os únicos que
continuaram a chegar em grande número ao Brasil. Entre 1945 e 1959, ainda
chegaram ao Brasil cerca de 250 mil portugueses.
Os Elementos Característicos da Identidade Brasilaica.
Como dissemos no início a identidade nacional envolve aspectos caracterizadores da nacionalidade: língua, credo, estrutura social e política, arquitetura, organização urbana, etc.... é um tema demasiado abrangente, que não comporta nessa breve exposição que já vai longe. Elencaremos apenas os principais que entendemos ser suficientes para explicitar essa identidade portuguesa em todo o Brasil.
O Brasil durante sua formação sempre deteve uma unidade linguística única em um país continental, que nem os EUA, Canadá, Rússia, China detém, e por vezes países muito menores como Inglaterra, Alemanha, Itália, Espanha e outros.... e um aspecto interessante a ressalta é que isso ocorreu organicamente, justamente por ocasião desse contínuo afluxo português para o Brasil, que assimilava os naturais transmitindo o português aos seus descendentes. Assim se inicialmente tivemos o tupi como língua dominante, a língua portuguesa se impois por um natural processo de assimilação dos contingentes integrados a civilização brasileira.
É conhecido e repetido verborragicamente, que o tupi deixou de ser falado por uma determinação administrativa de Pombal, como se os falantes aprendessem tupi em escolas públicas.... se quer existiam! O tupi foi sendo marginalizado em um processo gradual a medida que essa civilização brasilaica avançava. E embora continua, a imigração portuguesa para o Brasil apresenta picos. O primeiro com os colonos no primeiro século de colonização, uma segunda onda aflui com a descoberta das minas, concomitante a uma explosão demográfica no Minho, que levará a um dos maiores processos imigratórios da história mundial, com a vinda de minhotos para o Brasil, nesse momento, especificamente para Minas Gerais. Também nesse momento ocorrerá a ocupação dos sertões, e do Mato Grosso embalados por esse fluxo nortenho. É dessa forma que o tupi perde importância e espaço, deixando de ser falado nos grandes centros, se tornando uma língua secundária.
Esse processo se repete em todo o Brasil, mesmo entre as correntes imigratórias recentes, que assimiladas, repassam a língua portuguesa aos seus descendentes, já brasileiros.
Interessante mencionar a observação do historiador galego Júlio Cesar Barreto Rocha, citando Lindley Cintra sobre o português do Brasil se assemelhar mais galego do que ao atual português de Portugal, por ter se mantido mais conservado:
"Lindley Cintra, apoiado em Leite de Vasconcelos, alude, por exemplo, à "influência de hábitos articulatórios de um substrato étnico" de celtas, que, sabe-se, deslocaram-se desde o Norte, "cuja presença Estrabão e Plínio assinalam nas margens do Tejo". Desta forma, o próprio filólogo português explicita que o sistema vocálico luso teria sofrido influxos desde o Norte galego. A presença das vogais mais escandidas no galego atual, que possui menos força ao Sul, em Portugal (cujos falantes obscurecem as ocorrências destes sons, como em "m'nino" ou em "p'ssoa"), permanece mais integral no território brasileiro, cuja população, em sua quase absoluta totalidade, encontra parâmetro distintivo do falante português justamente nesta vocalização mais "perfeita" nossa, por assim dizer, igualando-se ao falante galego --que inegavelmente mantém também mais acesa esta "característica celta". A língua falada na Galiza, que é a real Pátria da Língua, que instituiu o sistema vocálico e a musicalidade do galego, faz-se presente no Brasil."
Outro fator característico na formação brasileira é a sua unidade religiosa, católica. A crença católica brasileira ao contrário do que possa parecer, não foi propriamente uma imposição do Estado, que ao longo da vida colonial se fez muito pouco presente, quase inexistente no seio da população. Isso foi agravado com o não reconhecimento por Roma, da restauração de Portugal, ao fim da união ibérica, quando Roma não reconheceu a nomeação de padres e bispos pela nova dinastia (Braganças) e que só virá a reconhecer em fins do Séc. XVIII. Durante todo esse período o catolicismo no Brasil se desenvolve organicamente, as populações a professam por pura tradição, porque descendem de católicos, a fé de sua linhagem. E disso vai resultar o catolicismo popular brasileiro de forte cunho medieval e que guarda substratos da antiga fé céltica ("pagã"). Veja que isso não ocorre nas colonias hispânicas, posto uma ostensiva e atuante doutrinação romana.
Outro aspecto a ilustrar, é a estrutura social e seus tipos humanos. Tema também demasiado abrangente e que nem de longe pretendemos esgotar. Apenas pontuamos que em grande parte, a estrutura social minhota se conserva no Brasil, sua estrutura familiar, as relações sociais, política, guardam uma proximidade muito grande com a observada no norte português. No Brasil as relações sanguinias eram bastante valoradas, revelando uma estrutura de clãs e uma rede de clientelia em torno de um chefe. Há ainda um rico arcabouço de tipos humanos, o padre que encarnava a figura de juiz de paz, intermediando conflitos e sendo guia espiritual da comunidade, e muitas vezes a figura mais letrada da comunidade. Vários antropólogos e historiadores traçam um paralelo a figura dos padres as funções dos druidas, oque seria uma adaptação dessa estrutura sob uma roupagem cristã. A figura dos menestréis (antigos bardos celtas), na figura de cantadores, ainda presentes tanto nos sertões setentrionais do Brasil quanto ao sul. Em fim, são rápidas pinceladas que ilustram essa reprodução da vida nortenha no Brasil com as devidas adaptações a vida nos trópicos.
Oliveira Viana, faz uma interessante análise da estrutura urbana das cidades coloniais brasileiras, eis oque diz:
"desta
transplantação de cultura que o português realizou no Brasil, trouxeram eles o
tipo de construção e povoados, vilas ou cidades, implantando entre nós a mesma
disposição na colocação dos edifícios, das ruas, das praças, das casas. Do
mesmo tipo de aldeia ou cidade portuguesa é que se fez o povoado ou vila
brasileira.: "os habitantes amontoados em
ruas sinuosas e estreitas garimpando o dorso dos montes a procura de alcançar a
torre. Pouco afastada a igreja matriz, geralmente no mesmo largo dominado pelas
paços do conselho, e entre os dois edifícios o pelourinho, onde a justiça por
vezes tão cruel fazia pública a sua autoridade." O desenho é de afonso Arinos de Melo e Franco, que
acrescenta: "retirando o elemento descaracterístico
da torre feudal, o quadro se aplica a uma tipica cidade colonial brasileira".
Na arquitetura há também um paralelo fortíssimo entre a arquitetura nortenha e brasileira, também presente em todo território nacional, do Oiapoque ao Chuí e mesmo ao Prata em Colonia do Sacramento. E que se acentua nas cidades históricas brasileiras.
Penso que esses elementos já são bastantes, ainda que sem adentrar em profundidade, oque poderemos tratar em outra oportunidade trazendo aspectos bem mais interessantes e reveladores de nossa identidade brasileira, brasilaica. O elemento fundamental na nacionalidade reside na descendência comum, sanguínea, e que uma vez conscientes, se unem politicamente, nisso resulta a nacionalidade. Os brasileiros mais do que serem uma nacionalidade, oque não é pouca coisa, apresentam uma identidade nacional muito bem consolidada, apesar de tantos quantos, a serviço do imperialismo queiram negá-la.
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