"Conservando nossa língua, ecoamos as vozes de nossos ancestrais."
A língua portuguesa merecia melhor tratamento e maior glória do que lhe é conferida na atualidade. Diferente do castelhano e do "alemão", que são línguas artificiais, inventadas, o português é uma língua histórica, de constituição orgânica que carrega em sua formação marcas "genéticas" de sua origem. Ao mesmo tempo que se trata de uma das línguas mais antigas faladas em todo o mundo. A guisa de comparação, o islandês, tido como a mais conservadora dentre todas as línguas escandinavas e mesmo da família germânica, não vai além de 1540. O português tal como o conhecemos retrocede a 1175 (havendo referencias ainda mais antigas de 1108)!
O francês antigo, bem como o provençal antigo, comparados com o francês, e o provençal falado hoje, são outras línguas. Isso não ocorre com o português arcaico. Este representa uma fase envelhecida do idioma, sem contudo ser outro.
Velho nalgumas formas, arcaico no emprego de muitas palavras, obsoleto na preferência de certas expressões (e diverso na pronúncia, provavelmente), o português dos primeiros tempos é sempre inteligível, porque a gramática é a mesma.
A língua portuguesa, que melhor seria chamar de: Galaico-portuguesa, nasce no noroeste peninsular. Foi essa a língua falada durante a Guerra de Reconquista contra os infiéis muçulmanos, e fator de distinção entre galaicos e sarracenos, que somado aos seus respectivos credos, os vinculavam a sua nação. Os galaicos, de fé cristã e língua galaica dos infiéis sarracenos, hereges e de língua árabe.
O latim se espraiou por toda península com a invasão romana, e no Séc. V, com as invasões bárbaras (suevos, visigodos, alanos, vândalos), se intensificou a corrupção da linguagem. Com a invasão árabe, no Séc. VIII, a decadência do latim se acentuou, o latim reduziu-se a uns falares vernáculos, e quase despareceu das Espanhas, como havia de suceder no norte da África. 'Aljamia' chegou a chamar-se o linguajar latino, e era como se dissesse 'o bárbaro', o estrangeiro, em oposição à 'aravia', a língua árabe.
Mas no fim do séc. XI (1097) criou-se o condado portucalense, logo depois elevado a reino por Afonso Henriques. Os sucessos estimularam às oposições religiosas, e os portugueses não quiseram mais falar em árabe. Não podendo volver ao esquecido latim aceitaram a fala barbarizada da gente mais humilde.
No que pese, indubitavelmente, ser uma língua "latina", com forte contribuição do romance, que a torna aparentada as demais línguas neolatinas. O galaico-português manteve substratos de sua origem céltica. De modo que alguns filólogos a classificam como uma língua celto-latina.
Dentre esses substratos, estaria o uso do verbo ser ao invés de ter, em frases possessivas, ex: "a chave é minha". A marcante presença de ditongos decrescentes. São exemplos, e não só, dentre outros, de características presentes nas línguas célticas.
O galaico-português desde então, se conservará, quase que por um milagre, sem maiores transformações.
É esse o idioma que se traslada para o Brasil. No que pese haver à época, oque se designou como: português quinhentista, um português mais padronizado e gramaticado. O português que aqui se estabelece, nos primeiros séculos de colonização, é o português nortenho, falado por aldeões e aristocratas rurais, em geral gente iletrada. Somente a camada letrada da sociedade, que basicamente se restringia, aos burocratas do Estado e padres, tinham acesso ao português gramaticado (quinhentista). Embora, com o perpassar do tempo, é ele que se estabelece nos dias atuais. Na população humilde o português arcaico resiste.
O emprego do infinito variável, ainda hoje usado com freqüência na língua popular, atesta sua proximidade com o português arcaico. Se não tivesse empregado o infinito variável , Camões teria escrito uma frase ambígua naquele célebre passo: "Ó Netuno, lhe disse, não te espantes de Baco no teus reinos receberes" (Lusíadas, VI, 15).
Repare como o segundo infinito variável, torna a frase mais leve, e o pensamento mais evidente na seguinte passagem de Alencar: "Nem por isso os outros deixam de continuar o seu giro, e as estações de seguirem o seu curso regular".
O uso do infinito variável, foi muito mais extenso no português antigo, e é mesmo mais notável na língua popular do que no português literário moderno. É um maravilhoso recurso de clareza, ou de ênfase, a que é lícito recorrer mesmo quando a gramática postula o contrário.
Em 1980, o filólogo Ataliba Castillo conta que quando se passou a debruçar sobre as diferenças entre o português falado no Brasil do de Portugal, ao contrário, do que inicialmente se pensava.... que o português no Brasil se distanciava do de Portugal. A verdade, era que o português de Portugal é que se afastara do português do séc. XV, e que se manteve no Brasil.
Existem depoimentos de gramáticos do Séc. XVI, dentre os quais: Fernão de Oliveira, que ao tentar descrever o modo de falar dos portugueses, dizia que: "os portugueses falam como pessoas de muito ciso, falam lentamente". Oque destoa do modo atual dos portugueses falarem, que se notabilizam pela contração de palavras, "engolindo" sílabas.
Esse distanciamento do português de Portugal, teria se processado no séc. XVIII, por influência francesa. Daí não só a tendencia de engolir sílabas no meio das palavras, como o de omitir sílabas finais. Bem como, o abandono, pelos portugueses atuais, do gerúndio, tão empregado no português-arcaico e ainda usual no português do Brasil.
A língua que se fala no Brasil, ainda que transpareçam diferenças da de Portugal, é, em essência, a mesma, pois que se compendia na mesma gramática. Essas diferenças são classificadas como "linguajar" que se alteram mesmo entre estrados sociais de uma mesma localidade, e que de modo algum, distingue como outra língua.
O português dos colonos da alta camada social manteve-se, por isso, com um caráter muito conservador: em 1618, o autor dos diálogos das grandezas dizia que o Brasil era Academia onde se sabia falar bem e que os jovens de Lisboa e doutras partes do reino aí vinham para aprender as boas falas [....] O número de brasileiros que iam formar-se na Universidade de Coimbra aumentava de século: 13 no século XVII e 1752 no século XVIII.
A língua que se fala no Brasil, ainda que transpareçam diferenças da de Portugal, é, em essência, a mesma, pois que se compendia na mesma gramática. Essas diferenças são classificadas como "linguajar" que se alteram mesmo entre estrados sociais de uma mesma localidade, e que de modo algum, distingue como outra língua.
O português dos colonos da alta camada social manteve-se, por isso, com um caráter muito conservador: em 1618, o autor dos diálogos das grandezas dizia que o Brasil era Academia onde se sabia falar bem e que os jovens de Lisboa e doutras partes do reino aí vinham para aprender as boas falas [....] O número de brasileiros que iam formar-se na Universidade de Coimbra aumentava de século: 13 no século XVII e 1752 no século XVIII.
De modo, que, se pode afirmar, que o português do Brasil é mais arcaico e melhor conservado do que o falado em Portugal. E que urge uma melhor preservação do nosso idioma, a exemplo do islandês, que vige uma política linguística formulada desde o século XVIII que proíbe a entrada de palavras estrangeiras, e que no lugar de adotar estrangeirismos, cria neologismos a partir de palavras próprias; além disso, reativa palavras antigas e cria outras baseadas em raízes bem conservadas na tradição linguística nacional.
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